terça-feira, 9 de março de 2021

PROCESSOS DE LULA PODE FICAR COM JUIZ QUE ANULOU PROVAS DA LAVA JATO

 

Caso de Lula pode ficar com juiz que anulou provas da Lava Jato

Breno Pires / BRASÍLIA

Ex-presidente Lula. FOTO: AMANDA PEROBELLI/REUTERS

Um juiz federal que já anulou provas da Operação Lava Jato em caso recente pode herdar os processos envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O titular da 12.ª Vara Federal do Distrito Federal, Marcus Vinícius Reis Bastos, está na lista dos quatro magistrados com chance de conduzir as ações que resultaram na condenação do petista, após o ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin apontar incompetência da 13.ª Vara da Justiça Federal do Paraná. A escolha de quem herdará os processos de Lula será feita por sorteio.

Bastos anulou, há exatos dois meses, as provas obtidas na Operação Carbonara Chimica, a 63.ª fase da Lava Jato, deflagrada para apurar suspeita de propina aos ex-ministros da Fazenda Antônio Palocci (governo Lula) e Guido Mantega (governos Lula e Dilma), em troca da edição de medidas provisórias favoráveis à Odebrecht.

À época, o juiz federal argumentou que a operação foi determinada por juízo incompetente e, por isso, as provas deveriam ser anuladas. É um entendimento que, se repetido no caso Lula, também tem potencial para  invalidar as diligências realizadas nos inquéritos envolvendo o petista por ordem do ex-juiz Sérgio Moro, da 13.ª Vara Federal do Paraná. “Pode anular as buscas e apreensões, por exemplo”, disse ao Estadão o advogado Celso Vilardi, que atuou na ação judicial com provas anuladas por Bastos.

O advogado Igor Tamasauskas também vê paralelo entre as situações. “A análise do juiz deverá levar em conta a ausência de atribuição do Ministério Público Federal do Paraná para cuidar do caso, com a possível nulidade das provas decorrentes”, afirmou Tamasauskas.

Caberá agora à Justiça Federal no Distrito Federal analisar as provas contra Lula nos casos do triplex do Guarujá, do sítio de Atibaia, da compra de um terreno para o Instituto Lula e de doações para a mesma entidade. Fachin não entrou no mérito das provas. O magistrado apenas examinou questões técnicas, concluindo que a Justiça Federal em Curitiba não tem competência para cuidar das ações contra o ex-presidente porque esses processos não apresentam conexão direta com o esquema de desvio de recursos na Petrobrás.

Denunciado pela Procuradoria-Geral da República por suposta compra de silêncio do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB-RJ), o ex-presidente Michel Temer também já foi absolvido pelo juiz Bastos. O caso se baseava na gravação do empresário Joesley Batista, em 2017, na qual  Temer dizia “Tem que manter isso aí”. “A prova sobre a qual se fia a acusação é frágil e não suporta sequer o peso da justa causa para a inauguração da instrução criminal”, disse o juiz, na ocasião, arquivando o caso.

Além de Bastos, também podem ser sorteados para herdar os processos de Lula a juíza substituta da 12.ª Vara, Pollyanna Kelly Medeiros, e os juízes federais Vallisney Oliveira, titular da 10.ª Vara Criminal da Justiça Federal do DF, e Ricardo Leite, substituto da 10.ª Vara.

Entre os quatro, Vallisney Oliveira é considerado por criminalistas como o mais “linha dura”. No fim de janeiro, o magistrado condenou a mãe do ex-ministro Geddel Vieira Lima a dez anos de prisão por lavagem de dinheiro e associação criminosa, no processo que apurou a origem dos R$ 51 milhões encontrados em malas de dinheiro, em 2017. Vallisney também é o juiz responsável pela Operação Zelotes, que tem Lula entre os réus. A operação apontou indícios irregularidades na compra de 36 caças Gripen.

O outro juiz encarregado dos processos da 10.ª Vara Federal é Ricardo Leite, que conduz a ação penal da Operação Spoofing. A operação  investigou os hackers que invadiram aparelhos celulares de integrantes da Lava Jato, expondo troca de mensagens entre Moro e procuradores. Leite tem um perfil considerado moderado por advogados criminalistas.

Pollyanna Kelly Medeiros, por sua vez, ficou marcada pela atuação dura na Operação Panatenaico, que apurou corrupção nas obras do Estádio Mané Garrincha. A juíza também é a relatora da Operação Registro Espúrio, que investigou esquema de favorecimento a sindicatos no extinto Ministério do Trabalho. Na lista de réus deste caso está o ex-deputado Roberto Jefferson, presidente do PTB.

PRAZO DE PATENTES NO INPI PODE SER REDUZIDO PELO STF

 

STF antecipa para abril julgamento que pode reduzir o prazo de patentes

Supremo avalia no dia 7 do próximo mês uma ação que pode reduzir o tempo de proteção de produtos e invenções; tema interessa a setores como o farmacêutico e químico

Lorenna Rodrigues, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA – O Supremo Tribunal Federal (STF) antecipou para 7 de abril o julgamento de uma ação que pode reduzir o prazo de patentes e afetar mercados gigantes, como a indústria farmacêutica, química e de biotecnologia.

Marcada inicialmente para 26 de maio, a análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.529 foi adiantada depois que o procurador-geral da República, Augusto Aras, apresentou pedido de liminar ao processo, que avalia a constitucionalidade de um artigo da Lei de Propriedade Industrial.

De acordo com a lei de 1996, patentes têm prazo de 15 anos a 20 anos, tempo contado a partir da data do pedido feito ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi). Depois desse período, podem ser feitas “cópias” de medicamentos, equipamentos e outras invenções livremente.

STF
Supremo antecipou julgamento depois de pedido de liminar feito pela PGR. Foto: Dida Sampaio/Estadão

A polêmica, porém, está em torno de uma regra da mesma lei que determina que o prazo de vigência da patente não será inferior a dez anos, no caso de invenções, e de sete anos para modelos de utilidade (atualizações de algo já existente), prazo contado a partir da concessão pelo Inpi. Como não há prazo para que o instituto conceda a patente, não há como saber quando a proteção cairá e muitas invenções acabam protegidas para além de duas décadas, prazo padrão no resto do mundo.

No pedido de liminar, Aras cita pelo menos 74 medicamentos que tiveram prorrogação de prazo com fundamento nesse dispositivo da lei, como medicamentos para o tratamento de câncer, HIV, diabetes e hepatites virais. É o caso, por exemplo, do medicamento Victoza (liraglutida), utilizado no tratamento de diabetes tipo 2. O pedido de patente foi feito em 1997, mas a concessão pelo INPI só se deu 20 anos depois, em 2017. Com a regra que determina os 10 anos de vigência a partir da concessão, a patente desse medicamento só cairá em 2027.

Aras cita a atual situação de crise sanitária causada pela covid-19 e afirma que essa regra “impacta diretamente no direito fundamental à saúde, haja vista que, enquanto não expirada a vigência de patentes de grandes laboratórios, a indústria farmacêutica ficará impedida de produzir medicamentos genéricos contra o novo coronavírus e suas atuais e futuras variantes”.

O pedido cita ainda estudo elaborado pelo Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que mostra que, entre 2014 e 2018, o governo federal gastou R$ 10,6 bilhões (ou cerca de R$ 1,9 bilhão por ano) com apenas nove medicamentos que teriam a patente expirada entre 2010 e 2019, mas que tiveram prorrogações de até oito anos por parte do INPI com base na regra de vigência mínima.

Versões

Quem defende a regra alega que há uma demora muito grande na análise dos pedidos pelo Inpi – hoje, em média, de cinco anos, mas que, em alguns casos, já chegou a 15 ou 20 anos. Com isso, sem o artigo que determina prazo mínimo de vigência, sobraria pouco tempo para que a invenção esteja protegida pelas leis de propriedade industrial.

Já o lado que questiona a constitucionalidade do artigo – como a própria PGR e mesmo representantes da indústria farmacêutica – também cita a demora nas análises do INPI como um fator de incerteza. “A Constituição diz que o inventor tem direito a patente, mas por prazo determinado. O artigo não se coaduna com a Constituição, porque o prazo não fica determinado”, afirma o presidente do Grupo FarmaBrasil, Reginaldo Arcuri, que representa farmacêuticas de capital nacional como AchéEurofarma e União Química.

Outro argumento pela manutenção da regra de prazo mínimo de vigência é que a proteção efetiva da invenção só se dá a partir da concessão efetiva pelo Inpi. Para Gustavo Svensson, diretor jurídico do Grupo NC, dono da EMS, maior produtora de genéricos do País, não é isso o que ocorre na prática.

Ele ressalta que a decisão pode ter um efeito econômico importante para o País, inclusive em medicamentos relacionados ao tratamento de covid-19, como antivirais e anticoagulantes. Por lei, um medicamento genérico tem de ser vendido com preço 35% menor do que o do original e, segundo Svensson , a média é de um valor 65% menor. “Espero que o Brasil dê uma resposta à altura do país que vivemos hoje, que é um país de renda baixa.”

‘Desincentivo’

Para o vice-presidente da Associação Brasileira de Propriedade Industrial (ABPI), Gabriel Leonardos, a derrubada do artigo seria um “tremendo desincentivo” a investimentos estrangeiros e a pesquisas e poderia prejudicar questões como patentes relacionadas à tecnologia 5G. “Se você é empresário e sabe que, na prática, só vai ter uma exclusividade por cinco a oito anos, você não vai querer investir”, afirma. 

Leonardos lembra que a regra está em vigor desde 1996 e diz que será uma “surpresa” se for declarada a inconstitucionalidade da lei. “A Constituição Federal não fala de prazo de vigência de patentes, isso não é matéria constitucional.”

Para a ABPI, o julgamento coloca em xeque a eficácia do INPI. A associação defende a autonomia financeira do instituto. “O INPI arrecada R$ 500 milhões por ano, pagos por quem pede patente, e tem um orçamento de apenas um quarto disso. Se você retirar o prazo mínimo de vigência e não der ao INPI instrumentos para examinar as patentes, será o pior dos mundos.”

Procurado, o INPI disse que, com relação à Lei da Propriedade Industrial, “como órgão do Executivo, apenas aplica o determinado em lei”. Questionado sobre a acusação de demora na análise nas patentes, disse que “em 2020, o tempo médio de decisão de pedidos de patente foi de 5,1 anos, contados a partir do pedido de exame”.

MOTIVOS PARA O MINISTRO FACHIN ANULAR AS CONDENAÇÕES DE LULA

 

Perguntas e respostas: entenda os impactos da decisão de Fachin que anulou condenações de Lula e as questões ainda em aberto

Conforme antecipou o ‘Estadão’ na semana passada, a manobra faz parte de uma estratégia do ministro de reduzir danos, tirar o foco do ex-ministro Sérgio Moro e preservar o legado da Lava Jato







Rafael Moraes Moura/ BRASÍLIA e Fausto Macedo, Paulo Roberto Netto, Pepita Ortega e Rayssa Motta/ SÃO PAULO

08 de março de 2021 | 23h07

Ex-presidente Lula. FOTO: AMANDA PEROBELLI/REUTERS

Em 46 páginas, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, anulou as condenações impostas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Lava Jato, determinou que as ações penais contra o petista sejam enviadas à Justiça Federal do Distrito Federal e o habilitou a disputar as próximas eleições presidenciais. Conforme antecipou o Estadão na semana passada, a manobra faz parte de uma estratégia do ministro de reduzir danos, tirar o foco do ex-juiz Sérgio Moro e preservar o legado da Lava Jato, diante de derrotas iminentes que ameaçam o futuro da investigação.

Na tarde desta terça-feira (9), a Segunda Turma do STF se reúne pela primeira vez após a decisão de Fachin. Nos bastidores, integrantes do colegiado insistem para que seja concluída a discussão sobre a suspeição de Moro no caso do triplex.

Confira abaixo as principais questões – algumas ainda em aberto – levantadas após a decisão que provocou um terremoto no meio político, abalou o mercado financeiro e surpreendeu o meio jurídico. 

O que o relator da Lava Jato no STF, Edson Fachin, decidiu sobre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva?

Fachin decidiu nesta segunda-feira anular todas as condenações impostas pela operação ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, conforme pedido pela defesa do petista em habeas corpus apresentado ao Supremo em novembro do ano passado. A decisão também determina o envio dos casos à Justiça Federal do Distrito Federal, a quem caberá analisar as provas colhidas contra Lula nos casos do triplex do Guarujá, do sítio de Atibaia e as ações sobre a sede do Instituto Lula e doações recebidas pela entidade. 

A decisão de Fachin significa que Lula não praticou corrupção ou lavagem de dinheiro?

O relator da Lava Jato no STF não fez juízo de valor sobre a inocência ou culpa de Lula na Lava Jato. Em uma decisão de 46 páginas, o magistrado se limitou a examinar questões técnicas ao concluir que a Justiça Federal de Curitiba não tinha competência para cuidar das ações contra o petista porque esses processos não dizem respeito diretamente ao bilionário esquema de corrupção na Petrobrás. Ao enviar para a Justiça Federal do Distrito Federal os casos de Lula, Fachin determinou que o juiz que assumir as ações deve decidir “acerca da possibilidade da convalidação dos atos instrutórios”. Ou seja: o próprio relator da Lava Jato indicou que a Justiça Federal do DF pode confirmar decisões tomadas por Curitiba.

“A fase instrutória é a fase onde se produzem provas, contra e a favor da acusação. Se a Justiça Federal do DF não convalidar os atos instrutórios (feitos por Curitiba), todos esses atos terão de ser produzidos novamente lá no Distrito Federal, caso ele convalide esses atos irá novamente à julgamento, possivelmente o juiz deverá reabrir o prazo para as providências das partes, ao final ele proferirá nova sentença, condenando ou absolvendo o ex-presidente Lula, mas dentro de uma vara competente para o julgamento da causa”, explicou o advogado Luiz Mário Guerra, especialista em Direito Penal.

De que forma a decisão de Fachin impacta a situação jurídica do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o cenário eleitoral de 2022?

A decisão de Fachin afasta a inelegibilidade do petista e o habilita, neste momento, a disputar as eleições presidenciais de 2022. Foi com base na condenação no caso do triplex que Lula foi enquadrado na Lei da Ficha Limpa e teve o registro de candidatura negado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2018, por 6 a 1 – apenas Fachin votou a favor do ex-presidente.

Em termos práticos, a condenação que Moro impôs a Lula no caso do triplex não existe mais.  

Lula pode voltar a perder a elegibilidade e ficar afastado de disputar as próximas eleições?

Beneficiado com a decisão de Fachin, Lula está neste momento elegível e apto para disputar as eleições de 2022. O petista, no entanto, pode voltar a ficar inelegível e ser afastado da corrida pelo Palácio do Planalto, apontam especialistas ouvidos pelo Estadão. Isso vai depender das decisões e do andamento dos trabalhos na Justiça Federal do Distrito Federal e no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que podem fazer o caso se arrastar por anos. “A inelegibilidade do Lula depende de uma decisão colegiada que o condene por um crime doloso que esteja entre os listados na Lei da Ficha Limpa. Portanto, o juiz federal do DF deverá considerar fatos do processo, as prescrições que incidem agora e proferir sentença; depois da sentença, o TRF confirma ou não a decisão (caso haja recurso)”, avaliou a advogada Marilda Silveira, especialista em direito eleitoral e membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep).

“Somente com uma decisão condenatória do Tribunal ele ficaria inelegível. O que define o ritmo do processo são as partes, incluindo o Ministério Público e o juiz: tempo das decisões, conclusão da fase probatória, manifestações e recursos”, acrescentou.

O advogado Renato Ribeiro de Almeida, especialista em Direito Eleitoral e Doutor em Direito do Estado pela USP, ressalta que a elegibilidade se analisa no momento do registro de candidatura que, na legislação atual, deve ocorrer em agosto de 2022. “Até lá, pode ser que Lula venha a ser novamente condenado e essa condenação ser confirmada pelo Tribunal Regional Federal”, observou.

Por que Fachin só decidiu sobre isso agora, cerca de quatro anos depois de Moro condenar Lula no caso do triplex?

O habeas corpus de Lula analisado pelo ministro chegou ao Supremo em novembro do ano passado, levando quatro meses para ser examinado.  Na decisão, Fachin observou que outras ações já haviam deixado o seu gabinete do STF e a Justiça Federal de Curitiba pelo mesmo motivo (falta de conexão direta com o esquema de desvios da Petrobrás). Esse ponto já havia sido levantado pela defesa de Lula em outras ocasiões, mas esta foi a primeira vez que Fachin analisou exclusivamente o argumento. “Com as recentes decisões proferidas no âmbito do Supremo Tribunal Federal, não há como sustentar que apenas o caso do ora paciente (Lula) deva ter a jurisdição prestada pela 13ª Vara Federal de Curitiba. No contexto da macrocorrupção política, tão importante quanto ser imparcial é ser apartidário”, escreveu Fachin.

O que acontece agora com as investigações contra Lula?

Ao enviar para a Justiça Federal do Distrito Federal os casos de Lula, Fachin determinou que o juiz que assumir as ações deve decidir “acerca da possibilidade da convalidação dos atos instrutórios”. Ou seja: o próprio relator da Lava Jato indicou que a Justiça Federal do DF pode confirmar decisões de Curitiba. “Nesse momento, o jogo de tabuleiro voltou para a casa um, só que o juiz pode andar mais rápido, pode pular algumas casas e aproveitar atos praticados por Sérgio Moro”, comparou Thiago Bottino, professor da FGV Direito Rio. Para Bottino, a decisão de Fachin esvazia as discussões sobre a parcialidade de Moro ao condenar Lula no caso do triplex. Integrantes da Segunda Turma do STF, no entanto, insistem para que o colegiado ainda analise a conduta de Moro.

“Os atos que teriam sido manchados pela parcialidade não têm mais validade, não existem mais no mundo jurídico. Agora se eles forem reaproveitados por esse juiz, essa questão pode voltar à tona”, disse.

Cabe recurso à decisão de Fachin? Quem vai analisá-lo?

Fachin levará ao plenário do STF a análise de um eventual recurso da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra a decisão que anulou quatro ações penais abertas pela Lava Jato contra o petista em Curitiba. Assim, caberá ao colegiado de onze ministros – e não à Segunda Turma, que tem imposto sucessivas derrotas a Fachin – decidir sobre o futuro das ações.

Como foi a reação dentro do STF à decisão de Fachin?

A determinação do ministro surpreendeu – e chocou – integrantes da Corte. Segundo o Estadão apurou, a manobra contou com o apoio do presidente do STF, Luiz Fux, com quem Fachin conversou após assinar a decisão. 

O que levou Fachin a tomar essa decisão agora?

Conforme revelou o Estadão na semana passada, Fachin lançou uma ofensiva para reduzir danos diante de derrotas iminentes que podem colocar em risco o legado da operação.  O ministro Kassio Nunes Marques, indicado ao tribunal pelo presidente Jair Bolsonaro, sinalizou nos bastidores a possibilidade de declarar suspeito o ex-juiz federal da Lava Jato, como pretendia a defesa de Lula.

A avaliação nos bastidores é que, se Moro fosse declarado suspeito no caso do triplex do Guarujá, os efeitos poderiam contaminar outros processos, como o do sítio de Atibaia. Por outro lado, a anulação das condenações por questões meramente processuais, formais, apontando a incompetência da Justiça Federal de Curitiba, permite o deslocamento dos casos para a capital federal e a preservação das apurações, segundo integrantes da Corte.

Por que a Lava Jato está enfraquecida no STF?

A Corte virou foco de oposição à Lava Jato, como mostrou o Estadão, e Fachin não conta hoje com situação confortável nem na Segunda Turma nem no plenário. Com a chegada de Kassio Nunes Marques ao Supremo, e a tentativa de aliados e inimigos políticos do presidente Jair Bolsonaro de desconstruir a imagem pública de Moro, o cenário para a Lava Jato no Supremo se tornou nebuloso. Nunes Marques tem se alinhado a Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, expoentes da ala garantista da Corte, para impor derrotas à operação. Na semana passada, por exemplo, a Segunda Turma, por 3 a 2, arquivou a denúncia de organização criminosa apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL) e outros três parlamentares no caso do “Quadrilhão do PP”. 

A decisão de Fachin encerra a discussão sobre a suspeição do ex-juiz Moro?

Na prática, a condenação que Moro impôs a Lula no caso do triplex foi varrida do ordenamento jurídico brasileiro. Na mesma decisão em que anulou as condenações contra o petista, Fachin determinou que fosse arquivado outro habeas corpus, em que Lula acusa o ex-juiz da Lava Jato de encará-lo como um “inimigo” e atuar com parcialidade ao condená-lo por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O julgamento da suspeição de Moro foi iniciado, em dezembro de 2018, pela Segunda Turma do STF, mas acabou interrompido por um pedido de vista de Gilmar Mendes. Integrantes da Segunda Turma do STF, no entanto, insistem para que o colegiado analise a atuação de Moro no caso, mesmo após Fachin anular a condenação do ex-juiz da Lava Jato contra Lula. A Segunda Turma se reúne na tarde desta terça-feira (9).

O que pode acontecer agora com as investigações contra Lula? Quem vai julgá-lo?

As ações serão analisadas agora pela Justiça Federal do Distrito Federal e, em um segundo momento, pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). O TRF-1, no entanto, possui um perfil mais “garantista” (mais inclinado a ficar do lado do direito de investigados) que o TRF-4, considerado mais “punitivista” por especialistas e investigadores ouvidos pela reportagem. O prazo de prescrição também pode ajudar Lula a escapar novamente da ilegibilidade.

“Há questões em aberto. Tudo indica que, dada a ordem de anulação do STF, com a desconstituição até mesmo dos recebimentos das denúncias, a grande parte dos ilícitos, senão todos eles, será atingida pela prescrição, com o pronto arquivamento dos feitos”, avaliou a advogada Maria Claudia Bucchianeri, que atuou a favor do registro de Lula em 2018.

DECISÃO DO STF DE ANULAR PROCESSOS DE LULA ABRE POSSIBILIDADE DE PRESCRIÇÃO DOS MESMOS

 

Deltan diz que decisão do STF abre chances de prescrição de processos contra Lula

Ex-coordenador da força-tarefa da Lava Jato, em Curitiba, critica anulação de condenações do ex-presidente, pelo Supremo, e ataca sistema de Justiça que ‘favorece a anulação’ das ações criminais; em perfil de rede social na internet, ele afirmou que Brasil vive um ‘amplo retrocesso’ no combate à corrupção

Ricardo Brandt e Pepita Ortega

Deltan Dallagnol, ex-coordenador da Lava Jato. Foto: Rodolfo Buhrer / Reuters

O ex-coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato, no Ministério Público Federal, em Curitiba, Deltan Dallagnol criticou a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) desta segunda-feira, 8, de anular as condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em seu perfil em rede social, ele afirmou que “esse é mais um dos casos derrubados recentemente num sistema de justiça que rediscute e redecide a mesma questão dezenas de vezes nas cortes e que favorece a anulação dos processos criminais”.

A 13.ª Vara Federal de Curitiba, do juiz Luiz Antônio Bonat, originária da Lava Jato, foi declarada incompetente para julgar os processos de Lula. Decisão do relator da Lava Jato no Supremo, Edson Fachin, determinou a anulação das condenações de Luiz Inácio Lula da Silva e o envio dos processos contra o ex-presidente para a Justiça Federal no Distrito Federal.

“Hoje, o Supremo Tribunal Federal anulou as condenações do ex-presidente Lula na Lava Jato, por entender que seus processos deveriam correr em Brasília e não em Curitiba. É preciso dizer três coisas sobre isso”, escreveu Deltan.

O procurador lembrou que “a tramitação desses casos em Curitiba foi decidida várias vezes pelos tribunais, inclusive pelo próprio Supremo”. “Ou seja, a condução desses casos em Curitiba pela Operação Lava Jato seguiu as regras do jogo então existentes. O que mudou para que viesse essa decisão contrária às anteriores? Houve uma mudança das regras do jogo no STF, que expandiu gradativamente seu entendimento de que os casos de Curitiba deveriam ser redistribuídos pelo país, conforme explicitado na decisão do Ministro Fachin.”

MDB. Deltan afirma que a “de fato, a Suprema Corte expandiu o entendimento de que os casos não relacionados diretamente à Petrobras deveriam sair de Curitiba” e lembra casos envolvendo políticos do MDB em corrupção na Transpetro. Na semana passada, o relator da Lava Jato havia retirado processo da 13.ª Vara Federal.

Para ele, “embora o Ministro Fachin tenha ficado vencido na maior parte desses outros casos, ele entendeu que o Tribunal precisava ser coerente e “apartidário” (única palavra sublinhada e negritada em sua decisão)”.

“Esse é mais um dos casos derrubados recentemente num sistema de justiça que rediscute e redecide a mesma questão dezenas de vezes nas cortes e que favorece a anulação dos processos criminais. Os tribunais têm um papel essencial em nossa democracia e precisam ser respeitados, mas o sistema de justiça precisa de aperfeiçoamentos.”

Em decisão de 46 páginas, o relator da operação no Supremo determinou a remessa dos autos dos processos à Justiça Federal do Distrito Federal, que vai decidir ‘acerca da possibilidade da convalidação dos atos instrutórios’. Em razão do entendimento, o ministro ainda declarou a perda de objeto de dez habeas corpus e quatro reclamações apresentadas à corte pela defesa do petista.

Prescrição. O ex-coordenador da Lava Jato afirmou que as investigações e processos envolvendo o ex-presidente serão retomados em Brasília, “mas com reais chances de prescrição dos crimes pelo decurso do tempo”. O juiz da 13.ª Vara Federal, em Curitiba, Luiz Antônio Bonat, informou que vai enviar os casos para a Justiça do Distrito Federal.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) informou nesta segunda-feira, 8, que vai recorrer da decisão de Fachin. Além das decisões de Moro, que condenou Lula no caso do triplex do Guarujá, Fachin também anulou os atos proferidos pela juíza Gabriela Hardt, responsável pela sentença no caso do sítio de Atibaia. O despacho do ministro, porém, deixa margem para que, em Brasília, o novo juiz titular do caso valide todos os atos praticados pela 13ª Vara.

A assessoria de imprensa da PGR informou que o recurso será preparado pela subprocuradora-geral Lindôra Maria de Araújo, braço-direito do procurador-geral, Augusto Aras, e responsável pelos processos da Lava Jato no STF. O órgão não deu detalhes sobre quais pontos da decisão serão contestados

Revés. Deltan afirma que a decisão não apaga dos processos as provas levantadas pela Lava Jato contra Lula. Para ele, “nada disso, contudo, apaga a consistência dos fatos e das provas dos casos, sobre os quais caberá ao Judiciário dar a última palavra”.

Segundo ele, é preciso atenção para o “amplo retrocesso” vivido no Brasil, no combate à corrupção. “Para além da anulação dos casos na operação Lava Jato, é preciso abrir os olhos para os amplos retrocessos que estão acontecendo no combate à corrupção – e aqui não trato mais de um ou outro caso concreto.”

LEIA A ÍNTEGRA DA POSTAGEM DE DELTAN DALLAGNOL

Hoje, o Supremo Tribunal Federal anulou as condenações do ex-presidente Lula na Lava Jato, por entender que seus processos deveriam correr em Brasília e não em Curitiba. É preciso dizer três coisas sobre isso.

1. Primeiro, a tramitação desses casos em Curitiba foi decidida várias vezes pelos tribunais, inclusive pelo próprio Supremo. Ou seja, a condução desses casos em Curitiba pela operação Lava Jato seguiu as regras do jogo então existentes. O que mudou para que viesse essa decisão contrária às anteriores? Houve uma mudança das regras do jogo no STF, que expandiu gradativamente seu entendimento de que os casos de Curitiba deveriam ser redistribuídos pelo país, conforme explicitado na decisão do Ministro Fachin.

De fato, a Suprema Corte expandiu o entendimento de que os casos não relacionados diretamente à Petrobras deveriam sair de Curitiba. Assim, recentemente, retirou de Curitiba casos envolvendo políticos do MDB em corrupção na Transpetro, pertencente ao Grupo Petrobras. Embora o Ministro Fachin tenha ficado vencido na maior parte desses outros casos, ele entendeu que o Tribunal precisava ser coerente e “apartidário” (única palavra sublinhada e negritada em sua decisão): se o STF retirou esses outros casos de Curitiba, aqueles envolvendo o ex-presidente também deveriam sair do local. Ou seja, para situações idênticas, entendeu que a decisão deve ser a mesma.

Esse é mais um dos casos derrubados recentemente num sistema de justiça que rediscute e redecide a mesma questão dezenas de vezes nas cortes e que favorece a anulação dos processos criminais. Os tribunais têm um papel essencial em nossa democracia e precisam ser respeitados, mas o sistema de justiça precisa de aperfeiçoamentos. Outros casos, como de corrupção na compra da refinaria de Pasadena, foram anulados pela mudança de entendimento do STF. Partindo do pressuposto de que o Ministro Fachin sempre teve uma atuação correta e firme, inclusive na operação Lava Jato, concluímos que ele, apesar de entender de forma diferente, aplicou o entendimento estabelecido pela maioria da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal.

2. As investigações e processos envolvendo o ex-presidente serão retomados em breve em Brasília, mas com reais chances de prescrição dos crimes pelo decurso do tempo. Várias questões ali discutidas serão rediscutidas novamente nos tribunais, inclusive no Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Nada disso, contudo, apaga a consistência dos fatos e das provas dos casos, sobre os quais caberá ao Judiciário dar a última palavra.

3. Para além da anulação dos casos na operação Lava Jato, é preciso abrir os olhos para os amplos retrocessos que estão acontecendo no combate à corrupção – e aqui não trato mais de um ou outro caso concreto. O fim da prisão em segunda instância dificultou demais a responsabilização dos corruptos, novas regras foram criadas que dificultam investigações e condenações, estão tramitando propostas que desfiguram a lei de lavagem de dinheiro e a lei de improbidade administrativa e há ações em marcha para retaliar os investigadores que trabalharam na Operação Lava Jato. Precisamos discutir essa série de mudanças em curso para definir como brasileiros que país queremos ter: o país da impunidade e corrupção, que corre o risco de retroceder vinte anos no combate a esse mal, ou um país democrático em que impere a lei. Essa é uma questão apartidária que impacta o futuro nosso e dos nossos filhos.

PARA LULA DISPUTAR ELEIÇÕES DE 2022 TEM QUE RESOLVER SITUAÇÃO JURÍDICA DE VÁRIOS PROCESSOS

 

Lula está apto para disputar eleições em 2022, mas pode voltar a ficar inelegível

O andamento dos trabalhos na Justiça Federal do Distrito Federal e no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) pode provocar nova reviravolta na situação jurídica do ex-presidente da República

Rafael Moraes Moura / BRASÍLIA

Ex-presidente Lula. FOTO: WERTHER SANTANA/ESTADÃO

Beneficiado com a decisão do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), que anulou as condenações que lhe foram impostas na Operação Lava Jato, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está neste momento elegível e apto para disputar as eleições de 2022. O petista, no entanto, pode voltar a ficar inelegível e ser afastado da corrida pelo Palácio do Planalto, apontam especialistas ouvidos pelo Estadão. Isso vai depender das decisões e do andamento dos trabalhos na Justiça Federal do Distrito Federal e no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que podem fazer o caso se arrastar por anos.

“A inelegibilidade do Lula depende de uma decisão colegiada que o condene por um crime doloso que esteja entre os listados na Lei da Ficha Limpa. Portanto, o juiz federal do DF deverá considerar fatos do processo, as prescrições que incidem agora e proferir sentença; depois da sentença, o TRF confirma ou não a decisão (caso haja recurso)”, avaliou a advogada Marilda Silveira, especialista em direito eleitoral e membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep).

“Somente com uma decisão condenatória do Tribunal ele ficaria inelegível. O que define o ritmo do processo são as partes, incluindo o Ministério Público e o juiz: tempo das decisões, conclusão da fase probatória, manifestações e recursos”, acrescentou.

Em julho de 2017, Lula foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no processo do triplex do Guarujá (SP) pelo juiz Sérgio Moro. A sentença foi confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), que ampliou a pena para 12 anos e 1 mês de prisão. Foi com base na condenação do TRF-4 que Lula foi enquadrado na Lei da Ficha Limpa e afastado da última eleição presidencial.

A decisão de Fachin anula não apenas as condenações contra Lula no triplex do Guarujá, mas também atinge ações, como a do Sítio de Atibaia e a das doações e da sede do Instituto Lula. O ministro do Supremo, no entanto, não invalidou as provas colhidas na investigação – e sim as encaminhou para que a Justiça Federal do DF faça uma nova análise do caso.

“Se as eleições fossem hoje, Lula poderia ser candidato. Isso porque não havendo mais contra si condenação criminal proferida em segunda instância, ele voltaria a status de pleno gozo de seus direitos políticos. Contudo, é bom salientar que a elegibilidade se analisa no momento do registro de candidatura que, na legislação atual, deve ocorrer em agosto de 2022. Até lá, pode ser que Lula venha a ser novamente condenado e essa condenação ser confirmada pelo Tribunal Regional Federal”, disse Renato Ribeiro de Almeida, advogado especialista em Direito Eleitoral e Doutor em Direito do Estado pela USP.

Para a advogada eleitoral Maria Claudia Bucchianeri, há questões que seguem em aberto, mesmo com Lula estando “absolutamente elegível” hoje.

“Eu diria que o destino de Lula ainda está nas mãos do Supremo Tribunal Federal. Isso porque, caso se entenda que o debate em torno da suspeição (do ex-ministro Sérgio Moro no caso do triplex) segue íntegro, então a extensão das nulidades será ainda maior, tornando matematicamente impossível a não ocorrência da prescrição integral dos delitos, bem assim a existência de qualquer condenação de segunda instância no curso espaço de um ano e meio”, comentou a advogada, que atuou na defesa do registro de Lula em 2018.

“Enquanto o STF não resolver isso, os processos não podem ter seu curso retomado na Justiça Federal do DF”, acrescentou.

segunda-feira, 8 de março de 2021

LEIS ANTICORRUPÇÃO PODEM SER VOTADAS NA CÂMARA DOS DEPUTADOS

 

Ofensiva na Câmara pode atenuar leis anticorrupção

Nos bastidores, as medidas são chamadas de “pacote da impunidade” por adversários do presidente da Casa, Arthur Lira (Progressistas-AL)

  •  Felipe Frazão, O Estado de S.Paulo

Depois de fracassar na tentativa de blindar parlamentares da prisão, a Câmara se prepara para enfrentar, nas próximas semanas, uma série de discussões com potencial para afrouxar leis anticorrupção e dificultar investigações. Nos bastidores, as medidas são chamadas de “pacote da impunidade” por adversários do presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL). A ofensiva reúne propostas que vão de mudanças nas leis de Improbidade Administrativa, Ficha Limpa, lavagem de dinheiro e proteção de dados para fins penais até a inviolabilidade de escritórios de advocacia.

A agenda é de interesse do Centrão, bloco de partidos que voltou ao comando da Câmara com a eleição de Lira. Logo no primeiro mês à frente da Casa, ele tentou aprovar a jato uma nova Proposta de Emenda à Constituição nesse pacote: a PEC da Blindagem, que amplia a imunidade parlamentar e restringe a possibilidade de prisão de deputados e senadores.

CâmaraDeputados conversam no plenário com o presidente da Câmara, Arthur Lira, nesta sexta, 26; ‘PEC da Blindagem’ deve seguir para análise de comissão especial, em derrota para Lira   Foto: Najara Araújo/ Agência Câmara

Foi uma resposta corporativa à prisão de Daniel Silveira (PSL-RJ), determinada no dia 16 pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), após o deputado bolsonarista divulgar um vídeo nas redes sociais com ofensas à Corte e apologia à ditadura militar. A manobra para aprovar a PEC sem passar pelo crivo de uma comissão só não vingou por pressão do Supremo e críticas de eleitores.

Diante do desgaste provocado na imagem do Congresso com a tentativa de autoproteção em um momento de agravamento da pandemia, os partidos se dividiram e Lira foi obrigado a recuar, enviando a PEC para análise de uma comissão especial. 

O presidente da Câmara rejeita o carimbo atribuído à iniciativa. “Não há impunidade nem blindagem. Nossa prioridade é não permitir que a gente viva nesse contexto de crise institucional semanal”, disse Lira em recente live promovida pelo grupo Prerrogativas, que reúne advogados. “Não vai faltar coragem para debater os temas necessários, que tenham clamor.”

Na semana passada, a Mesa Diretora da Casa liberou o funcionamento das comissões, que estavam paralisadas, entre elas o Conselho de Ética. À exceção da PEC da Blindagem e da ideia em negociação de apresentar uma proposta separada para alterar a Lei da Ficha Limpa, as demais proposições do “pacote” foram herdadas do período em que Rodrigo Maia (DEM-RJ) era presidente da Câmara. Algumas estão sendo preparadas desde 2019 e passaram por comissões especiais de juristas.

É o caso da proposta de criação da Lei Geral de Proteção de Dados Penal (LGPD-Penal) e da reforma da Lei de Lavagem de Capitais. Propostas feitas nessas comissões indicam que há risco de entraves às investigações e abrandamento de penas. Em 2020, o ritmo foi lento e nenhuma delas chegou a ser votada, apesar da derradeira tentativa de emplacar a proibição para ações de busca e apreensão em escritórios de advogados com base apenas na palavra de delatores.

“Tem comissões trabalhando há bastante tempo, que ainda não deram resultado. Outras estão mais adiantadas, como é o caso da que trata da improbidade. (A análise) vai ser muito no caso a caso, mas não vai haver corte em tudo”, afirmou Margarete Coelho (Progressistas-PI), que faz parte do núcleo de confiança de Lira. Foi ela a relatora da PEC da Blindagem, que amplia a imunidade parlamentar, e a deputada integra a maior parte dessas comissões.

Suspiro. O deputado Lafayette Andrada (Republicanos-MG), relator do projeto de prerrogativas dos advogados, disse que, “como houve uma série de atropelos”, Lira ainda não teve tempo para se debruçar sobre todas as propostas: “Quando houver um suspiro, essas pautas vão andar. Essas comissões voltarão ao normal, elas não morreram”.

Na Câmara, além da comissão da improbidade, a que está mais adiantada é a que trata da prisão após condenação em segunda instância. As duas já têm relatórios finais. Com as revelações da Operação Spoofing, mostrando a troca de mensagens entre procuradores e o ex-juiz Sérgio Moro no processo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os parlamentares que costumam defender a Lava Jato temem ser derrotados. A portas fechadas, muitos manifestam receio de que o momento político favoreça acabe afrouxando a norma.

No caso da improbidade administrativa, sete dos atuais 24 integrantes da comissão especial criada na Câmara podem ser beneficiados por mudanças na lei, como revelou o Estadão. Eles respondem a processos , e as alterações propostas podem livrá-los de eventuais punições.

Recentemente, o presidente Jair Bolsonaro disse que a atual Lei de Improbidade é burocrática e “engessa o prefeito”. Já o líder do governo, Ricardo Barros (Progressistas-PR), defendeu a liberação da contratação de parentes no serviço público. Ou seja, quer autorizar o nepotismo, hoje proibido pela Lei de Improbidade e também pelo Supremo.

Ficha Limpa. Criada em 2010 inspirada nos movimentos anticorrupção, a Lei da Ficha Limpa, por sua vez, também deve sofrer modificações, assim que a pandemia arrefecer, como mostrou o Estadão. A proposta chegou a entrar na PEC da Blindagem, mas foi retirada na frustrada tentativa de votar o texto a toque de caixa.

Agora, a ideia do PT e de partidos do Centrão, como o Progressistas e o Republicanos, é apresentar uma PEC separada, prevendo a possibilidade de novos recursos judiciais para salvar a candidatura de políticos hoje proibidos de disputar eleições porque foram condenados por decisões colegiadas. Para Lira, a Lei da Ficha Limpa “não pode ser uma prisão perpétua”. Condenado na Lava Jato, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ficou inelegível em virtude dessa lei.

Para o deputado Aliel Machado (PSB-PR), a Câmara não deve se precipitar em votações polêmicas sem ter certeza de que terá apoio: “Lira me disse que todas as discussões devem ser decididas no plenário, não vai segurar nada”. Machado assume em breve a presidência da comissão especial da PEC que analisa a prisão em segunda instância. O Supremo derrubou, no fim de 2019, a possibilidade de execução antecipada de pena. A medida era um dos pilares da Lava Jato e a decisão permitiu a libertação de Lula.

Agora, a Câmara pode alterar a Constituição e prever a execução antecipada da pena. Em conversas reservadas, porém, parlamentares admitem que a chance de uma reviravolta assim ocorrer é próxima de zero. Machado acredita que o texto pode ir a plenário em 45 dias, mas não quer se precipitar. “Pautar a prisão em segunda instância de um dia para o outro, como aconteceu com a PEC da imunidade, pode fazer com que se perca todo o trabalho”, disse o parlamentar.

AS ARMADILHAS DA INTERNET E OS FOTÓGRAFOS NÃO NOS DEIXAM TRABALHAR

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