domingo, 28 de fevereiro de 2021

ENTREVISTA SOBRE CAPITALISMO E DEMOCRACIA

 

“O CAPITALISMO PRECISA DE DEMOCRACIA FORTE E INCLUSIVA PARA CONSEGUIR SE SUSTENTAR”

Professora mais disputada de Harvard prevê que a agenda de proteção ambiental e social vai prevalecer sobre autoritarismos porque é melhor para os negócios

Texto: Luciano Huck, especial para o Estado

Huck conversa com Henderson, para quem a pandemia nos deu a oportunidade de repensar a educação

Esta semana, passamos dos 250 mil mortos pela covid-19 no Brasil, e a fotografia dos próximos meses não parece nada boa. De um lado, o contágio avança de maneira ainda mais violenta com novas cepas do vírus estrangulando a capacidade das UTIs nos hospitais; do outro, o negacionismo e falta de planejamento fazem com que a imunização da população avance lentamente demais, mesmo com toda experiência e capilaridade do SUS.

Desde o começo da pandemia venho publicando no Estadão conversas com pensadores, filósofos, professores e autores do mundo afora que possam contribuir no debate e iluminar o caminho pós-pandemia. De Yuval Harari a Esther Duflo, de Michael Sandel a Anne Applebaum, foram vários encontros inspiradores.

Hoje mergulho em um tema que me salta aos olhos e me faz pensar e refletir, o capitalismo. Nenhum outro sistema tirou tanta gente da pobreza, mas é evidente que ele não deu totalmente certo se levarmos em conta as enormes desigualdades que gerou – acentuadas ainda mais pela pandemia. Acredito que nossa geração tem a responsabilidade de reinventar o capitalismo a fim de curar as feridas causadas no século 20.

Por isso hoje trago para este espaço a professora e autora americana Rebecca Henderson. Ela simplesmente comanda o curso mais disputado da Harvard Business School e carrega o título de maior prestígio dessa universidade, honraria hoje limitada a apenas 25 acadêmicos.

Henderson é especialista em inovação e mudança. Virou a referência global nos temas de ESG (Governança Ambiental, Social e Corporativa), que são centrais na medição da sustentabilidade e impacto social dos negócios, que definitivamente entraram no radar dos grandes investidores – até mesmo no Brasil. Recentemente, ela lançou o livro Reimagining Capitalism in a World of Fire (Reimaginando o capitalismo em um mundo em chamas, em tradução livre), em que faz a defesa do capitalismo e, ao mesmo tempo, da necessidade de ajustá-lo para contemplar imperativos sociais e ambientais.

Na conversa a seguir, Henderson faz uma bela leitura dos nossos gargalos de desenvolvimento e detalha sua visão de mundo, um sopro otimista em meio a tanta notícia ruim. Ela acredita que a agenda ESG tende a prevalecer não só porque é a escolha moralmente correta, mas também porque é importante para o sucesso dos negócios. Lembra que regimes autoritários têm, por sua natureza, problemas de sustentabilidade. E esclarece por que o sucesso do capitalismo depende de uma sociedade civil fortalecida e de uma democracia genuína e inclusiva – justamente a equação que tem me levado nessa jornada de escutar-pactuar-agir que me anima a seguir adiante.


VEJA A SÉRIE COMPLETA ‘UMA CONVERSA COM LUCIANO HUCK’ :


Luciano Huck: Pessoalmente ainda enxergo o capitalismo como  o melhor sistema econômico. Nenhum outro sistema até hoje tirou tanta gente da pobreza quanto o capitalismo. Mas está claro que ele não deu totalmente certo. Basta observar as obscenas desigualdades que ele gerou e ficaram ainda mais evidentes depois da pandemia. Parte da missão da nossa geração é reinventar o capitalismo, um capitalismo 4.0 que cure as feridas causadas no século 20. Você navega muito bem por esse tema nas suas aulas e nos seus livros. Você poderia falar um pouco sobre isso? Como podemos construir um capitalismo justo e sustentável?

Rebecca Henderson: Concordo completamente com você. O capitalismo é incrível. Quando funciona como deveria, ele gera inovações formidáveis, empregos de boa qualidade e muitas oportunidades. Mas o capitalismo exige equilíbrio. Mercados livres e empresas livres são absolutamente fantásticos, mas precisam ser estruturados. Se você falar para um empresário “ei, faça dinheiro, sem regras, sem limites, apenas vá”, você o estará convidando a forçar salários para baixo, jogar lixo nos oceanos e rios, cortar todas as árvores, corromper políticos… Precisamos encontrar um equilíbrio entre o livre mercado, governos eleitos democraticamente, capazes e transparentes e uma sociedade civil forte. Não estou falando que “vamos nos amar” ou “tudo será sempre lindo”. Estou falando de encarar as coisas como uma negociação, em que cada um tem os próprios interesses. Os governos têm o papel de estabelecer regras. Os negócios têm um papel de criar empregos e inovação. E a sociedade civil tem o papel de manter esses dois entes sempre em xeque.

Luciano Huck: Existe em algum lugar do planeta alguma iniciativa pública ou privada que tenha saído apenas do campo das ideias e de fato esteja aplicando novos experimentos, novas fórmulas ao capitalismo?

Rebecca Henderson: Não estou falando de algo imaginário, isto é muito real. Um amigo uma vez me entrevistou acerca do meu livro e ele me disse “Rebecca, seu livro não deveria se chamar ‘Reimaginando o capitalismo’, deveria se chamar ‘Poderíamos, por favor, voltar ao capitalismo dos anos 50, só que sem a misoginia e o racismo?’.” Se você olhar para o que tínhamos nos EUA nos anos 50, era isso o que a gente tinha: um governo forte, um mercado forte e padrões de vida que cresciam de forma estável para aqueles na base da pirâmide de distribuição de renda. Era possível manter um emprego e construir uma família. Hoje, Alemanha, Dinamarca e Japão são sociedades com níveis baixos de desigualdade. Não existe uma imensa separação entre os ricos e os pobres, como vemos no Brasil e nos EUA. Há uma cooperação próxima entre os negócios e o governo e um nível elevado de investimento em treinamento e educação para o homem comum, não somente para as pessoas que nasceram com os pais certos. Hoje está na moda ser cruel em relação ao Japão, porque a curva de crescimento se manteve reta durante muito tempo, mas o Japão ainda é a 3.ª maior economia do planeta, imensamente produtiva, com níveis baixíssimos de pobreza. Não estou dizendo que qualquer uma dessas sociedades seja perfeita. Os EUA nos anos 50 tinham grandes problemas, especialmente nos tópicos de racismo e misoginia. Mas nós podemos criar um capitalismo que funcione para todos. Já aconteceu antes. Existem lugares no planeta em que isso está acontecendo. E podemos fazê-lo novamente.

Se você concentra poder e renda em um pequeno grupo, o crescimento econômico desacelera, as taxas de inovação desaceleram, e a raiva cresce”Rebecca Henderson

Luciano Huck: Algumas das personalidades mais admiradas das últimas décadas foram empreendedores que construíram empresas bilionárias a partir de criações que impactaram o cotidiano das pessoas. Steve Jobs, Bill Gates, Elon Musk… A meu ver, as cabeças mais admiradas nas próximas décadas terão um perfil distinto. Serão aquelas que conseguirem repensar o capitalismo, endereçar a pobreza extrema e solucionar, além das palavras, as disfunções das sociedades a nível global. Estou errado?

Rebecca Henderson:  Luciano, acho que você está completamente certo. Nossa ideia do que significa ser um líder vai mudar significativamente. Ainda vamos admirar pessoas que constroem grandes empresas e geram empregos, mas acho que vamos olhar para pessoas como Hamdi Ulukaya, o CEO da Chobani, uma empresa de iogurte, e pensar “esse cara é demais!”. Ele construiu uma empresa incrível, o iogurte é uma delícia, mas ele disse “eu sou um imigrante, vou me certificar que pessoas em dificuldade tenham empregos, salários decentes, oportunidades de promoção, que elas possam ser cidadãos plenos em nossa sociedade”. Ele diz: “eu sou um nômade e um guerreiro, sou hospitaleiro, mas jogo duro”. Esse é o tipo de homem de negócios que precisamos ver. Um dos meus heróis pessoais é Paul Polman, que foi CEO de uma das maiores empresas do mundo, a holandesa Unilever. Eu o vi trabalhar, e ele era simplesmente incrível. Ele era ao mesmo tempo um executivo agressivo à moda antiga e um líder que levava a sério o discurso de que, como a Unilever tocava um bilhão de pessoas por dia, a empresa era fundamental para melhorar o mundo.

Luciano Huck: O Terceiro Setor, a filantropia e o capital para o bem evoluíram muito nas últimas décadas. Eram tímidas iniciativas escondidas no subsolo das empresas e hoje são fundos bilionários de impacto e grandes corporações entendendo que pensar no próximo é o melhor jeito de pensar em si. O compromisso ESG, com o meio ambiente, o impacto social e a boa governança, agora ocupa a agenda dos grandes tomadores de decisão ao redor do mundo. Você é referência mundial nessa pauta ESG. O que você pensa sobre essa transformação?

Rebecca Henderson: É, de fato, a coisa certa e moral a se fazer. Mas há muito interesse próprio embutido nisso. Nós estamos destruindo os sistemas de suporte à vida do planeta, e isso não é bom para ninguém. E também não é nada bom para os empresários que as cidades sejam inundadas, que as secas arruínem as colheitas ou que os sistemas agrícolas entrem em colapso. Não é bom para os empresários que milhões de pessoas se percebam deixadas para trás e sintam raiva. Isso aumenta o risco de que surjam governos autoritários e extrativistas, de pessoas que chegam ao poder para enriquecer. Isso não é bom para os negócios. Ou seja, há um ângulo de negócios importante nessa guinada. Os dados indicam que tratar os trabalhadores com respeito, pagando um salário decente e dando-lhes liberdade para tomar decisões, é a melhor forma de administrar uma empresa. É o que eu chamo de sistema elevado de emprego. Quando você eleva o patamar da sua relação com os funcionários, você passa a ver a sua produtividade, criatividade e inovação crescendo drasticamente. Pode ser mais difícil, você vai ter de investir a longo prazo, vai ter de ser um líder realmente autêntico para fazer sua empresa seguir adiante, mas você não vai apenas sobreviver, você vai abrir mercados completamente novos.

Deixe-me lhe dar um exemplo. Tenho um amigo que deixou um emprego extenuante no setor de private equity para aceitar a posição de CEO de uma empresa de lixo. Não é algo sexy, mas ele queria fazer a diferença. Se nós encontrarmos uma forma como lidamos com os resíduos que geramos, podemos reduzir a quantidade de emissões em centenas de milhões de toneladas. Já na primeira semana, ele teve de lidar com um problema gigantesco. Todo o setor no qual a empresa atuava era imensamente corrupto. Tanto a empresa dele quanto seus competidores estavam descartando lixo de maneira ilegal ou enviando os resíduos para o exterior sem a devida identificação. As multas por violações eram mínimas, e a fiscalização era muito fraca. Ele anunciou que atuaria apenas dentro da lei e aumentaria os preços para cobrir os custos de fazê-lo. A maioria na empresa achou que ele tinha ficado maluco. Metade da equipe sênior pediu demissão. Alguns clientes desistiram. Mas a corrupção funciona melhor quando está escondida. Assim que ele tornou a decisão pública, muita gente reagiu e começou a se desdobrar. Os funcionários que ficaram estavam animadíssimos para trabalhar para uma empresa preocupada em fazer as coisas da maneira certa. Muitos clientes se mostraram dispostos a pagar mais. Os investidores passaram a apoiá-lo, porque passaram a acreditar que aquele modelo de negócios dominaria o mercado. E eles estavam certos.

Luciano Huck: Estamos vivendo uma necessária transformação de mentalidade das lideranças empresariais. De uma estrutura vertical onde um fala e outro apenas ouve, para algo mais aberto, maleável, democrático, mas não menos produtivo.

Rebecca Henderson: É apenas pensar nas coisas de uma forma nova. Em vez de pensar apenas em mim, agora pensar em nós e no que podemos criar juntos. É ver problemas como oportunidades para a criação de novos negócios. Pense no homem que criou a “carne do futuro”: ele teve a abertura de capital mais bem-sucedida dos últimos 20 anos porque encontrou uma forma completamente nova de ganhar dinheiro. Um amigo meu que é CEO teve um problema de saúde e perdeu a capacidade de falar – ele apenas consegue falar com grande dificuldade. E ele me disse “Rebecca, essa foi uma das melhores coisas que já me aconteceram, pois quando as pessoas vêm ao meu escritório perguntar o que deveriam fazer, a única coisa – literalmente – que eu consigo dizer é “o que você acha?”, e de repente eu descobri que as pessoas têm ideias das mais variadas, de todo tipo!”. A empresa começou a crescer muito mais rápido e hoje consegue pagar salários melhores e contratar mais.

Luciano Huck: O Brasil pode e deveria ser a maior potência verde do planeta, uma potência agroindustrial sustentável. Mas, enquanto governos e negócios mundo afora estão investindo na economia verde, os líderes brasileiros estão trilhando um caminho diametralmente oposto. O governo brasileiro não está tomando nem a mínima responsabilidade pela maior floresta tropical do mundo de forma séria. Que dirá administrar de forma inteligente, sustentável e moderna os trilhões de reais que existem ali. Qual deve ser o impacto desse novo capitalismo, o papel e responsabilidades dos governos e empresas em relação ao meio ambiente?

Rebecca Henderson: Eles devem ser parceiros no investimento no longo prazo. Nosso meio ambiente é um ativo preciosíssimo. E destruí-lo também vai destruir a saúde de milhões de pessoas. Hesito de falar do Brasil, Luciano, porque eu não sou brasileira, mas a cooperação que tinha sido obtida nas administrações anteriores, entre governo e empresas em relação à preservação da Amazônia, foi um dos grandes exemplos mundiais do que corporações éticas podem ser. A união de pecuaristas, clientes do mercado da soja e fazendeiros no solo, em busca de uma solução que funcione para todos, e que governos anteriores ajudaram a emplacar, é um dos maiores exemplos que já vimos do que progresso deve parecer no mundo. Podemos cortar as florestas, mas o que temos depois disso? Madeira queimada.

Espero que o legado da pandemia seja a constatação de que nenhum de nós está saudável enquanto todos não estiverem saudáveis”Rebecca Henderson

Luciano Huck: O Brasil está vivendo uma situação delicada. O governo incentiva e ameaça subsidiar o consumo de combustíveis fósseis. Indo na direção oposta das melhores políticas de geração de energia e sustentabilidade. A ciência mostra que precisamos ter emissões negativas a partir da segunda metade do século.

Rebecca Henderson: Incentivar a produção de combustíveis fósseis me parece moralmente errado e economicamente desastroso. Queimar combustíveis fósseis resulta em graves danos à saúde humana. Quando você queima carvão ou óleo, você joga na atmosfera partículas venenosas de, por exemplo, mercúrio e chumbo. Ou seja, você está destruindo a saúde humana aqui e agora. Além disso, você está contribuindo com o aquecimento global, o que naturalmente vai gerar imenso sofrimento no mundo. E é uma escolha econômica estúpida, porque significa investir em indústrias do passado. Fica claro que precisamos seguir em frente. Os maiores investidores do mundo estão começando a indicar para as empresas de suas carteiras que elas precisam reduzir as emissões de carbono. Estão tirando dinheiro de empresas petroleiras ou que não possuem planos de transição energética e colocando em tecnologias avançadas. Em muitos lugares do mundo, as energias renováveis estão sendo ofertadas a um preço significativamente mais barato do que os combustíveis fósseis. Pelo fato de os EUA terem sido lentos em abraçar essa trajetória, estamos vendo a liderança em energia solar e eólica indo para países da Europa e para a China. Fomos lentos em fazer a transição para veículos elétricos. Estamos tentando entrar nessa onda agora, mas ficamos para trás. Seria um erro gigantesco se o Brasil, que possui um espaço gigante para evoluir e pessoas brilhantes, decidir abraçar indústrias do século 20 em vez de olhar para novos caminhos.

Luciano Huck: Qual sua avaliação das métricas modernas de aferição de riqueza e desenvolvimento, como o PIB?

Rebecca Henderson: O conceito de PIB foi inventado há cerca de 100 anos. As pessoas eram mais pobres e fazia sentido pensar que a felicidade estava atrelada a quantas coisas elas possuíam. Mas agora sabemos que, assim que você tem uma renda que seja suficiente para você se manter, uma moradia segura, uma saúde decente e um emprego, a felicidade é determinada por uma série de outras coisas. As pessoas no Brasil são muito mais felizes do que deveriam ser, dado seu nível de renda. E as pessoas no Leste Europeu são muito menos felizes. Podemos especular a razão disso, mas ela não se resume a renda. Ao medir o PIB, estamos medindo apenas a produção recente, não estamos medindo os estoques de longo prazo. É como administrar uma empresa sem acompanhar o que acontece com seus ativos. Você pode prontamente aumentar o PIB cortando todas as árvores do país, mas você estará destruindo todos seus ativos de longo prazo. Hoje, a variação do PIB já não faz mais sentido como medida. Precisamos equalizá-la com medidas de igualdade, bem-estar social e preservação ambiental.

Parte da missão da nossa geração é reinventar o capitalismo, um capitalismo 4.0 que enderece as desigualdades e cure as feridas do século 20”Luciano Huck

Luciano Huck: O Brasil é um dos países mais desiguais do planeta, com uma enorme concentração de renda e uma elite que até hoje sempre foi acusada de não se comprometer de fato com a construção de um país menos desigual, principalmente na geração de oportunidades. Para um país que quer se desenvolver, combater a pobreza não é bom apenas para a consciência, mas também para o bolso. No seu trabalho mais recente, você lança o desafio de como oferecer um novo enquadramento intelectual e um caminho plausível para um capitalismo que perdeu seu compromisso com a liberdade e a prosperidade na busca obstinada de maximizar o valor do acionista. Você pode falar um pouco sobre isso?

Rebecca Henderson: Os comprometimentos normativos mais profundos do capitalismo, os valores que, na minha visão, conferem ao capitalismo sua legitimidade são prosperidade e liberdade para todos. Se o capitalismo colapsa, a ponto de que poucos de fato se tornam ricos e têm acesso a oportunidades, ele perde sua legitimidade moral, perde seu apoio político e, a longo prazo, torna-se ruim para aqueles que têm dinheiro. Os dados sobre isso são muito claros. Se você concentra poder e renda em um pequeno grupo, o crescimento econômico desacelera, as taxas de inovação desaceleram, a raiva cresce. O que faz uma sociedade mais próspera e rica no longo prazo é trazer todos para dentro da sociedade, dar chances a todos. Porque todos juntos podemos gerar ideias e riquezas de uma forma que o pequeno grupo que gostaria de controlar tudo nunca conseguirá. É por isso que acredito que no futuro as democracias ocidentais vão prevalecer e superar, por exemplo, a autocracia crescente da China. A situação de exclusão que vivemos agora é muito perigosa para o capitalismo.

Luciano Huck: Em muitos recortes do planeta temos visto a democracia em risco em função da ascensão ao poder de governos autoritários, negacionistas, de extrema direita e tecnopopulistas. Você enxerga a combinação capitalismo + democracia como a melhor e mais eficiente para buscar uma sociedade mais justa e sustentável?

Rebecca Henderson: Sim! Mercados livres precisam de política livre. Mas a única forma de o capitalismo se sustentar no longo prazo é em uma parceria firme com uma democracia genuína e inclusiva.

Luciano Huck: Você tem uma relação com o Brasil.

Rebecca Henderson: É verdade. Meu marido cresceu no Brasil. A mãe dele era uma refugiada polonesa e o pai dele era um americano que foi ao Rio de Janeiro abrir um escritório de uma companhia de seguros. Eles se conheceram e se apaixonaram. Ele nasceu nos EUA, mas dos 6 meses de idade até os 9 anos ele cresceu no Brasil. Acho que ele é um pouco brasileiro. Ele é muito amigável, aberto e ama pessoas. Fomos ao Brasil juntos alguns anos atrás e pensei “oh, é por isso que meu marido é assim” (risos).

Estamos vivendo uma necessária transformação de mentalidade das lideranças empresariais. Mais aberta e maleável, mas não menos produtiva”Luciano Huck

Luciano Huck: Como você enxerga o Brasil? E as nossas maiores potencialidades?

Rebecca Henderson: Quando estive no Brasil, tive a oportunidade de conhecer diversos empresários brasileiros que acreditam que reimaginar o capitalismo é algo central. Tive a grande honra de encontrar alguns dos principais executivos da Natura, CEOs envolvidos em criar uma aliança pelas florestas brasileiras, empreendedores que estão investindo em energias renováveis… Um deles descobriu um processo inovador que reduz drasticamente a energia necessária para produzir aço. Eles me descreveram um futuro para o Brasil imensamente promissor. Vocês têm os recursos, o espaço, a riqueza, uma população educada. Há oportunidade para crescer de forma sustentável – embora dizer “sustentável” pareça meio bobo –, ou melhor, de uma forma que renove o mundo e mostre o que o capitalismo pode ser de verdade. É possível criar uma sociedade justa e sustentável. Acredito que, de todos os países do mundo que têm essa oportunidade, o Brasil é o mais importante.

Luciano Huck: Você é professora, alguém que dedica seu tempo a compartilhar e ensinar conhecimento. Quais transformações no formato de ensino você acha que a pandemia vai impor?

Rebecca Henderson: Acho que a pandemia nos deu a chance de repensar a educação. Poderemos misturar o que há de melhor nos recursos digitais e o que há de melhor no ensino presencial. Todos os professores que trabalham em uma sala de aula têm acesso a vídeos e exercícios de todos os lugares do mundo. Agora, podemos levar a melhor educação para os lugares mais remotos. Não digo que isso será fácil, mas acho que é possível de uma forma que não era dez anos atrás. O retorno potencial é imenso.

Luciano Huck: Qual você acha que será o maior impacto da pandemia, na ótica econômica?

Rebecca Henderson: Acho que a pandemia nos mostrou que desigualdade não é só uma palavra. São pessoas reais que não estão conseguindo se manter e estão morrendo. Pessoas que não conseguem pagar seus aluguéis ainda que estejam trabalhando em tempo integral, que não têm benefícios de saúde ou recursos nos quais possam se ancorar. Acho que a pandemia colocou um rosto humano na igualdade. Que, em vez de se trancarem em belos escritórios, os gestores tiveram de encarar a realidade, de que possuem responsabilidade pelas pessoas que trabalham para suas empresas. E espero que isso traga compaixão. Sei que alguns empresários podem dizer “sabe, foi só quando vi as pessoas que trabalham para mim passando dificuldades em suas casas, com suas crianças no colo, que percebi a diferença que podemos fazer em suas vidas”. Viver em um momento como esse é pensar não só em quanto dinheiro conseguimos fazer e quão rapidamente podemos ser promovidos, mas “quem sou eu? e o que estou querendo fazer no mundo?”. Espero que o legado da pandemia seja a realização de que nenhum de nós está saudável enquanto todos não estiverem saudáveis. Nenhum de nós é rico enquanto todos não possamos ser prósperos e livres. E que isso dará início a uma mudança de mentalidade que é tão crítica se queremos criar uma sociedade melhor.

Luciano Huck: Somos um país de empreendedores. Qual a sua mensagem para essa comunidade Brasil afora?

Rebecca Henderson: Passei os primeiros 20 anos da minha carreira estudando mudanças em grandes corporações. Trabalhei para companhias como Kodak e Nokia. Os jovens nem conhecem mais essas empresas. Essas empresas viram o futuro e se recusaram a mudar. E ninguém as conhece mais. Estamos em um momento similar. Estamos diante de uma profunda mudança em como precisamos lidar com nossa economia se queremos que nosso meio ambiente sobreviva e nossa sociedade prospere. Esse é um momento de mudança. Não tenham medo disso. A mudança é sempre desconcertante. Mas as empresas que se negam a mudar morrem. Aquelas que abraçam a mudança são bem-sucedidas, fazem mais dinheiro e se divertem muito mais.

Luciano Huck: Muito obrigado pela conversa, professora.

HOME OFFICE DEVE SER UMA OPÇÃO PERMANENTE DO GOVERNO

 

Criticado por Bolsonaro, home office é adotado por 1 em cada 4 servidores públicos

Dentro do governo, 35 órgãos já aderiram ao programa que vai colocar o teletrabalho como opção permanente na administração pública

Idiana Tomazelli, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA – Um em cada quatro servidores do Executivo federal terminou o ano de 2020 trabalhando em home office integral, a mesma modalidade adotada pelo presidente da PetrobrásRoberto Castello Branco, acusado pelo presidente Jair Bolsonaro de ficar “11 meses sem trabalhar”. 

Home office
Presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, recém demitido por Bolsonaro Foto: Sergio Moraes/REUTERS

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Além disso, 35 órgãos do governo já aderiram ao programa que vai colocar o teletrabalho como opção permanente na administração pública. Quatro deles estão dentro do Palácio do PlanaltoCasa CivilGabinete de Segurança Institucional (GSI), Secretaria-Geral da Presidência e Secretaria de Governo.

A pedido do Estadão/Broadcast, o Ministério da Economia informou que havia 142.995 servidores federais do Poder Executivo em trabalho remoto integral no mês de dezembro de 2020, último levantamento realizado pela pasta. O número representa 23,8% dos 599,9 mil funcionários ativos no mesmo período.

Descontente com a política de preços de combustíveis adotada pela Petrobrás, Bolsonaro anunciou a demissão de Castello Branco do comando da companhia e passou a criticá-lo por, entre outros motivos, estar em regime de trabalho remoto. “O atual presidente da Petrobrás está há 11 meses em casa, sem trabalhar. Trabalha de forma remota. O chefe tem que estar na frente, bem como seus diretores. Isso para mim é inadmissível. Descobri isso faz poucas semanas”, afirmou o presidente na segunda-feira passada.

As declarações de Bolsonaro geraram indignação dentro da Petrobrás porque o presidente da companhia tem 76 anos e está no grupo de risco para a covid-19. Em sua primeira aparição pública após ser demitido, Castello Branco afirmou que o regime de teletrabalho gerou ganhos de produtividade e redução de custos, além de ter contribuído para diminuir a contaminação pelo novo coronavírus na empresa.

Os ganhos de produtividade e a redução de custos são justamente os efeitos buscados pelo Executivo federal ao adotar o trabalho remoto como prática permanente. No ano passado, o governo economizou R$ 1,5 bilhão ao deixar de gastar com diárias, passagens, conta de luz e água e cópias e reprodução de documentos, além de despesas com auxílio-transporte, horas extras, entre outros benefícios a servidores.

Economia

Para 2021, a previsão é poupar um valor ainda mais significativo, pois a migração definitiva para o teletrabalho vai permitir ao governo se planejar para a revisão de aluguéis e ocupação de espaços físicos.

Em dezembro, o secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, Caio Paes de Andrade, estimou que dos cerca de 600 mil servidores em atividade no Executivo, aproximadamente 200 mil estão em posições que, a princípio, se encaixariam no modelo de trabalho remoto. Não significa que todos eles migrarão para o home office. Antes disso, dois passos são essenciais: o órgão aderir, apontando quais atividades podem ser exercidas a distância, e o servidor manifestar desejo pela mudança.

Entre os 35 órgãos que já aderiram estão 11 agências reguladoras, Banco Central, os ministérios da Economia, do Desenvolvimento Regionalda Cidadaniade Minas e Energia, as quatro pastas abrigadas no Palácio do Planalto (Casa Civil, Secretaria-Geral, Secretaria de Governo e GSI), além de fundações, institutos e superintendências ligadas a essas estruturas.

A implantação do chamado Programa de Gestão (PGD) inclui o trabalho realizado de forma presencial, híbrida e teletrabalho. Oito órgãos já concluíram a implantação do sistema informatizado que fará a gestão do PGD.

EMPRENDEDORISMO - ONLINE TO OFFLINE

 

DESCUBRA A FORÇA DA INTEGRAÇÃO ONLINE TO OFFLINE NO MARKETING!

Maria Teresa Lopes

Mas, o que significa a integração online to offline? Em poucas palavras, se você se interessou, pesquisou e comprou algum produto pela internet e foi retirar na loja, fez parte dessa estratégia. Assim, o O2O – ou online to offline – serve para identificar compras que mesclam tanto o meio digital quanto o físico.

O que algumas empresas não sabem, no entanto, é que essa integração é mais do que positiva para as vendas. Isso porque, devido a forte presença do online no dia a dia das pessoas, é possível que toda a relação com a marca seja desenvolvida antes mesmo delas pensarem em adquirir um produto.

Então, se você deseja entender mais sobre todo o funcionamento da estratégia online to offline, acompanhe o artigo abaixo!

Online to offline: como aumentar as vendas?

A união do online to offline pode ser muito válida, influenciando os usuários à compra pela internet e efetivando essa ação na loja. Mas, o que isso quer dizer? O cliente terá contato com o seu e-commerce e poderá acompanhar de perto os seus produtos, além disso, poderá ir até a loja e buscar por outras opções.

Oferecemos aos lojistas do Vale do Aço o nosso Marketplace e E-Commerce para divulgar a sua empresa, seus produtos e promoções na nossa Plataforma Comercial Valeon que está preparada para promover as suas empresas na internet através das mídias sociais existentes.

Para que você compreenda melhor como aumentar as vendas através do online to offline, selecionamos as principais ações para ter sucesso nessa estratégia:

Entenda o seu consumidor

Hoje em dia, com estudos e dados assertivos, é possível entender exatamente quem é o seu consumidor. Essa ação, no entanto, não é exclusiva do online to offline.

O seu negócio, provavelmente, tem um público específico e você deve entender as suas dores e desejos. É muito importante mapear as ações dos seus usuários e otimizar pontos de interesse dos seus clientes que sua empresa ainda não atende. É necessário fugir do comum e evitar mapear os usuários pelos mesmos padrões de sempre: gênero, idade, ocupação. Procure entender o que o seu cliente precisa que você ainda não faz.

O foco está no cliente, não na venda

O cliente só comprará se estiver satisfeito com a sua empresa, caso tenha se sentido bem no ambiente da sua loja ou se teve uma boa experiência no seu e-commerce. Então, antes de voltar seus esforços totalmente para a conversão, foque antes em quem vai realizá-la.

Sua empresa está oferecendo o que seu cliente realmente quer? Use os dados para mapear a trajetória do cliente e as demandas recorrentes. Retire o máximo de obstáculos do caminho do usuário, deixe-o livre para fazer as suas escolhas, seja online ou pela loja física. O objetivo aqui é eliminar qualquer empecilho que torne a experiência de compra fadada ao fracasso.

Para o online to offline, é fundamental que não haja discrepância entre a facilidade de compra online e na loja física e, muito menos, que haja uma comunicação diferente.

Use múltiplos canais

Se você analisou bem a sua buyer persona, provavelmente sabe em qual rede ela mais se encontra. Então, você utilizará essa mesma rede para chegar até ela, seja através de anúncios ou posts orgânicos. Dê prioridade para as estratégias focadas no tempo ocioso do seu público, como no caso das redes sociais.

Ofereça opções

É importante que você indique diversas opções para o seu cliente. Na estratégia online to offline, o cliente escolhe o que mais convém a ele, seja comprar virtualmente ou não. Assim, ofereça opções para facilitar que o usuário faça aquilo que ele deseja. Utilize da isenção de frete, oportunidade de testar na loja, compra pelo aplicativo e recebimento em casa, etc.

Acompanhe toda a jornada

A jornada do cliente é individual e sabemos que cada usuário toma a sua decisão no momento em que mais lhe convém. No entanto, é possível que você ajude o consumidor a realizar a compra, mesmo que ela já tenha se decidido antes de chegar à sua loja.

Os clientes que fazem parte da estratégia online to offline já pesquisaram em casa e, por isso, têm noções abrangentes sobre o produto e sobre o que desejam. Dessa forma, é importante que o consumidor tenha acesso a informações relevantes e de qualidade.

Devidamente nutrido, ele poderá ser encaminhado para a próxima etapa da jornada e, assim, realizar a compra de forma muito mais agradável.

Organize sua loja física

omnichannel veio para ficar e sabemos disso! No entanto, abandonar a sua loja física pode ser um grande erro e a estratégia online to offline está aqui para mostrar isso.

A sua loja física deve estar preparada para atrair os clientes e otimizar os processos, e isso tudo deve ser integrado aos canais online. Dessa forma, unifique a comunicação e a experiência do usuário.

O atendimento e a sua loja devem ser um cartão de visita e mostrar aos clientes que a experiência presencial também é muito válida. Além disso, é importante evidenciar ao cliente que ele tem total liberdade para a compra tanto online quanto offline.

E então? Entendeu melhor como funciona toda a integração online to offline? Se ficou alguma dúvida, nos contate!

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“As startups têm o diferencial de lançar produtos e se conectar com o mercado e com seus consumidores rapidamente.”

“O futuro pertence aos que assumem risco, não aos que buscam segurança. Quanto menos você busca segurança e mais busca oportunidade, mais segurança você terá.” – Brian Tracy

Entre Aspas  💭  Deixo você com um quote de Charles Darwin, para refletir durante esse momento no qual a mudança é a única constante:
“Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente. Quem sobrevive é o mais disposto à mudança.

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BOLSONARO INTERFERE NA ECONOMIA BRASILEIRA

 

‘Velho’ Bolsonaro ‘renasce’ com intervenção na economia

 José Fucs – Jornal Estadão

Desde a sua posse, em janeiro de 2019, o presidente Jair Bolsonaro deixou para trás em várias ocasiões o receituário liberal pregado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, que ele procurou capitalizar em seu favor na campanha eleitoral. Confira a seguir uma série de posições antiliberais adotadas por Bolsonaro em seus 26 meses no governo, que deixam à mostra a velha mentalidade nacional-desenvolvimentista e corporativista que marcou a sua trajetória política.

Abertura econômica

Em vez de promover a abertura ampla e irrestrita prometida por Guedes, Bolsonaro cedeu ao lobby das entidades ligadas à indústria, adiando por prazo indeterminado o corte generalizado de tarifas de importação. Nos últimos meses, passou a cogitar a recriação do antigo Ministério do Desenvolvimento (MDIC) – cuja incorporação ao Ministério da Economia pra considerada essencial por Guedes para viabilizar a abertura longe da pressão dos empresários – com o objetivo de atender a interesses políticos e corporativos.

Preços dos combustíveis

Irritado com os aumentos nos preços dos combustíveis, Bolsonaro indicou o general Joaquim Silva e Luna para substituir o atual presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, gerando muita desconfiança no mercado sobre interferências na companhia. Além disso, defendeu uma suposta “função social” das estatais, em vez de apoiar uma gestão profissional, que possa gerar mais dividendos para o governo aplicar em saúde, educação e segurança.

Banco do Brasil

Incomodado com a decisão da instituição de fechar agências e abrir um programa de demissão voluntária para reduzir custos, Bolsonaro ameaçou demitir seu presidente, André Brandão. Embora a ameaça não se tenha concretizado, Brandão acabou colocando o cargo à disposição na sexta-feira, 25, e deverá deixar o governo.

Ceagesp

Apesar de a privatização da Ceagesp (Cia. de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo) ter sido incluída no PND (Plano Nacional de Desestatização)em seu governo, Bolsonaro disse recentemente, numa visita à empresa, que, enquanto for presidente, “nenhum rato vai sucatear isso aqui para privatizar para os seus amigos”.

Reforma administrativa

Por decisão de Bolsonaro, a proposta enviada pelo governo ao Congresso para mudar o RH do Estado, excluiu os atuais servidores. Também ficaram de fora militares, parlamentares, magistrados, promotores e procuradores.

Supermercados

Numa reação que fez lembrar os tempos do Plano Cruzado, em 1986, alvo de duras críticas de Paulo Guedes na época, Bolsonaro apelou ao patriotismo dos donos de supermercados para conter a inflação nos alimentos, dando a entender que os preços cobrados nas gôndolas dependem do altruísmo alheio e não das forças de mercado.

Energia solar

Em oposição ao que defendia a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), Bolsonaro impediu a revisão dos subsídios concedidos a quem produz energia solar para uso próprio, uma benesse cujo custo alcançará R$ 34 bilhões até 2035, segundo o Ministério da Economia.

Banana do Equador

A pedido de Bolsonaro, o Ministério da Agricultura restringiu a importação de banana do Equador para proteger produtores nacionais, ao revogar duas Instruções Normativas que definiam regras fitossanitárias para importação do produto.

Leite em pó

Atendendo a lobby do agronegócio, Bolsonaro anunciou o aumento do imposto sobre importações de leite em pó, para compensar o corte do imposto antidumping, de até 14,8%, promovido pelo Ministério da Economia.

ELEIÇÕES MUNICIPAIS INTERFEREM NOS SERVIÇOS PÚBLICOS NO BRASIL

Como as eleições municipais afetam os serviços públicos no Brasil

 BBCNEWS

O que acontece com os serviços públicos no Brasil alguns meses antes e pouco depois das eleições municipais?

O acesso à saúde pública piora – e fica ainda mais precário caso o candidato à reeleição perca a disputa -, incumbentes tentam contornar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e a Lei das Eleições para empregar possíveis aliados, e demissões e contratações em massa provocam caos na prestação de serviços, além de servirem para “ajustar” as contas dos municípios.

Essas foram algumas das descobertas apresentadas pelo pesquisador Guillermo Toral em sua tese de doutorado no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos, na qual o acadêmico espanhol analisou, entre outros temas, como políticas dinâmicas em quatro eleições municipais afetaram serviços públicos, em especial a saúde, entre 2002 e 2016.

“Estamos acostumados com a dinâmica de que na campanha o político fica mais responsável. Então, a minha premissa era de que antes e durante a eleição a prestação de serviços de saúde melhoraria. Na verdade, os dados mostram que ela piora”, diz à BBC News Brasil Toral, atualmente professor assistente na Universidade Vanderbilt (EUA).

Pela Constituição de 1988, compete aos municípios oferecer (com a ajuda dos Estados e da União) saúde básica e educação a seus habitantes. As prefeituras devem gastar no mínimo 40% de seus recursos nestes dois setores (15% para saúde e 25% na educação), que costumam figurar entre os mais importantes para a população nas eleições municipais.

Ainda assim, o pesquisador identificou que durante o período eleitoral o número de consultas de pré-natal diminuiu, em média, 2,6% em setembro e 10% em dezembro, por exemplo.

Quando o prefeito perdeu, a situação piorou: consultas de pré-natal caíram 13,7% no último trimestre do mandato (e seguiram em queda de 14,7% no primeiro trimestre da nova administração); exames de pré-natal diminuíram 13,7% no período; e consultas médicas com bebês e crianças despencaram 19,3% e 23,3%, respectivamente, assim como visitas de enfermeiros (queda de 24,9%) e médicos (-39%). Essas baixas não foram compensadas no início da gestão seguinte.

Toral optou por dados de saúde materna e da criança porque eles envolvem consultas não eletivas, sendo assim mais simples estabelecer uma relação entre oferta e acesso a serviços. O Ministério da Saúde recomenda ao menos sete consultas de rotina no primeiro ano de vida da criança – e outras duas no segundo ano – para avaliar o seu desenvolvimento.

Caso o número de consultas caia, argumenta Toral, não se trata de as crianças estarem “mais saudáveis ou porque os pais resolveram não levá-las à Unidade Básica de Saúde” (UBS). “Há um calendário de consultas para acompanhá-las. Essas quedas falam sim de um efeito negativo na prestação de serviço de saúde.”

Para chegar a essas conclusões, Toral analisou dados do Sistema Único de Saúde (SUS), do Sistema de Informação da Atenção Básica à Saúde (SIAB) entre 2004 e 2015, e informações anuais sobre contratações/demissões de milhões de funcionários públicos municipais (apenas em 2016, por exemplo, foram quase 6 milhões de contratos) em 4.909 municípios (661 foram descartados por falta de dados) pela Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), do Ministério da Economia.

Empregadores de todo o país, incluindo governos municipais, precisam inserir os dados de seus funcionários nesta plataforma, como o tipo de contrato e nível de educação.

O pesquisador ainda se baseou em mais de 120 entrevistas em profundidade com promotores, juízes, secretários municipais de Educação, Saúde, Assistência Social, gestores de UBS, entre outros atores, em sete Estados durante 18 meses de trabalho de campo.

Então porque o sistema de saúde sofre durante as eleições?

Há uma série de fatores envolvidos, mas utilizando métodos estatísticos avançados que buscam estabelecer conexões causais entre diversas variáveis (por exemplo, derrota nas eleições com o aumento de demissões de servidores), o acadêmico identificou uma relação forte com a rotatividade de funcionários públicos durante o período eleitoral, uma vez que prefeitos possuem liberdade significativa para definir contratações e demissões de empregados, incluindo professores e médicos.

Vai e vem de servidores

A tese mostra que pouco antes do período eleitoral, entre junho e julho, há “ciclos significativos” na contratação e demissão de funcionários municipais. Essa seria uma estratégia dos prefeitos para contornar restrições legais aplicadas nos últimos dois trimestres do mandato para coibir o uso político de cargos públicos durante o pleito.

A Lei das Eleições proíbe a contratação, nomeação, demissão sem justa causa e a transferência e exoneração de servidores do município nos três meses anteriores à data da eleição. Já a LRF veda o aumento da despesa com pessoal entre 5 de julho e 31 de dezembro do último ano da gestão.

A rotatividade de empregos é mais presente em contratos temporários – que representam um terço do funcionalismo público municipal, segundo Toral -, porque são mais simples de manipular do que acordos de servidores concursados. Essa movimentação, diz a tese, aparenta ser “muito mais forte” quando os prefeitos “estão expostos a níveis mais elevados de competição eleitoral”.

As contratações aumentam 20,8% em junho em um ano eleitoral na comparação com o mesmo período de um ano sem eleições (alta de 15,1% entre não concursados e 8,6% para concursados). Por outro lado, há uma queda de 34,8% nas contratações em agosto e 12,6% em dezembro.

Em janeiro, já na nova gestão e sem congelamento de pessoal, as admissões sobem 143% comparadas ao mesmo período sem eleição. Essa trajetória se mantém em fevereiro (22,1%) e março (27,6%).

Os dados sugerem que essa rotatividade é “de natureza clientelística”, uma vez que trabalhadores “de baixa escolaridade” (e menor renda) “têm maior probabilidade de serem contratados e demitidos na época das eleições” do que no mesmo período não eleitoral.

Durante o congelamento, entre agosto e novembro, as contratações tendem a ser de níveis mais elevados de instrução – que seriam mais fáceis de se justificar -, e novamente mais baixos em janeiro e fevereiro.

“Não é segredo que o emprego público é um recurso político importante. Quando você vai ao interior, ouve-se muito essa ideia de que ‘aqui a política é bem intensa’ e ‘a gestão não pode ser separada da política’. Há a ideia de que o emprego público é um recurso político que de algum jeito está muito polarizado”, explica Toral.

As demissões seguem um padrão semelhante ao das contratações. As saídas diminuem na fase eleitoral e sobem após o pleito, “sugerindo que os prefeitos tentam compensar a inflação pré-eleitoral com demissões” para “ajustar” as finanças do ano fiscal.

Em agosto de um ano eleitoral, por exemplo, há 14,3% menos demissões. Mas as saídas aumentam 44,4% em outubro e 90,9% em dezembro. As demissões no fim do mandato afetam mais os funcionários com menor escolaridade.

O pesquisador ressalva que cargos de confiança não estão sujeitos ao congelamento de pessoal e que algumas saídas são de servidores aposentados ou falecidos e de funcionários que foram candidatos nas eleições e precisam deixar suas vagas, mas as saídas “devem-se principalmente às ações dos empregadores”.

Rotatividade de funcionários causa caos no sistema de saúde

Quando o candidato à reeleição perdeu a disputa, a situação na saúde se deteriorou. Aqui também aumentaram as demissões e contratações, levando a interrupções na entrega de serviços públicos “devido a essas mudanças burocráticas e ao enfraquecimento da responsabilidade intra-governo nos meses após a eleição”.Pesquisa mostra que quando o candidato à reeleição perde a disputa, a situação na saúde se deteriora© Getty Images Pesquisa mostra que quando o candidato à reeleição perde a disputa, a situação na saúde se deteriora

A dispensa de temporários subiu 42% no último trimestre do ano eleitoral quando o prefeito perdeu, contra 26,2% quando ganhou.

As contratações de temporários nos primeiros três meses da gestão do novo prefeito subiram, em média, 99,2% comparadas às daqueles municípios onde o titular foi reeleito.

“Esses resultados estão de acordo com pesquisas anteriores que mostram que, no Brasil, os vencedores das eleições usam nomeações burocráticas para recompensar seus apoiadores”, diz a tese.

De acordo com Toral, o declínio na oferta de serviços de saúde pode ser provocado por diversos fatores, incluindo a rotatividade de funcionários especializados (médicos e enfermeiros, por exemplo), a menor responsabilização/monitoramento de servidores após a derrota do prefeito, e outras medidas que afetam o trabalho dos profissionais nestes cerca de três meses em que o derrotado ainda tem poder de decisão e a posse do novo governo.

“[Os prefeitos] podem mexer com a contratação de insumos importantes à prestação de serviços. Por exemplo, um entrevistado me falou que se o prefeito perde, eles cancelam os contratos de transporte e a gente não tem como ir para zona rural”, explica.

Para chegar às conclusões de como o acesso à saúde piorou quando o prefeito foi vencido nas urnas, o pesquisador comparou os municípios nos quais o incumbente é reeleito por uma pequena margem e aqueles onde o prefeito perde por pouco.

Essa escolha metodológica, explica Toral, ocorreu porque uma comparação simples entre todos os candidatos seria “tendenciosa”, pois prefeitos reeleitos facilmente tendem a gerir melhor a cidade. E aqueles que antecipam uma derrota ampla poderiam realizar uma rotatividade de servidores maior e a prestação de serviços públicos poderia ser menor antes da eleição.

Derrotados nas urnas se “vingam” dos vencedores

Quando perdem, os prefeitos ainda têm poder para afetar a gestão do candidato vencedor. E para isso podem utilizar os contratos de concursados, que apesar de estarem mais isolados de elementos políticos não estão imunes a eles. Geralmente, os prefeitos decidem quantos servidores efetivos aprovados em concursos serão convocados e quando.

Toral argumenta que os prefeitos derrotados “fazem uso estratégico de seu arbítrio nas nomeações burocráticas, em resposta a seus incentivos políticos únicos”. Ou seja, costumam contratar concursados no fim do mandato para limitar a capacidade fiscal da nova gestão de empregar seus próprios apoiadores em cargos temporários.

As análises das entrevistas qualitativas, diz o pesquisador, sugerem que os derrotados usam demissões de temporários no fim do mandato para “limpar as contas” e reduzir as chances de processos sobre possíveis atos ilícitos quando o novo titular tiver acesso aos dados da administração anterior.Segundo pesquisadores, candidato que perde a reeleição se "vinga" do adversário, reduzindo o caixa na nova gestão© Rovena Rosa/Agência Brasil Segundo pesquisadores, candidato que perde a reeleição se “vinga” do adversário, reduzindo o caixa na nova gestão

Limitar o impacto negativo das eleições municipais na oferta de serviços públicos à população exige abordagens mais criativas, como encurtar o tempo entre a data do pleito e a posse do vencedor. “Não se justifica ter um período tão longo. Para a imensa maioria dos municípios há quase três meses onde uma pessoa que está de saída segue tomando decisões”, diz Toral.

“E isso pode ferir tanto por ação quanto por omissão porque parte do trabalho dos secretários e do prefeito é de supervisão do serviço público. Mesmo se eles não fazem nada, isso pode ferir a saúde, a educação, etc”, completa.

 

SATÉLITE BRASILEIRO SERÁ LANÇADO HOJE PARA VIGIAR A AMAZÔNIA

 

Satélite brasileiro Amazonia 1 será lançado na madrugada deste domingo

 Da Redação – VEJA

O foguete que colocará em órbita o Amazonia 1, primeiro satélite de observação da Terra totalmente projetado e operado pelo Brasil, será lançado na madrugada deste domingo, 28, à 1h54 (horário de Brasília). O lançamento, a partir do Satish Dhawan Space Centre (Shar), em Sriharikota, na Índia, está previsto para ocorrer à 1h54, horário de Brasília. A transmissão ao vivo terá início às 23h50, no canal do Inpe no Youtube e no canal do MCTI na mesma plataforma, com a participação de especialistas do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e da Agência Espacial Brasileira (AEB). Os vídeos serão gravados e ficarão disponíveis para o público após o evento. O Amazonia 1 será colocado em órbita pela missão PSLV-C51, da agência espacial indiana Indian Space Research Organisation (ISRO). Com seis quilômetros de fios e 14 mil conexões elétricas, o satélite integra a Missão Amazonia 1, que tem como meta fornecer dados para observar e monitorar o desmatamento, especialmente na região amazônica, além de monitorar a agricultura no país. De acordo com o instituto, o novo satélite observará também  região costeira,  reservatórios de água e florestas (naturais e cultivadas), além de possíveis desastres ambientais.

BRASILEIROS IMIGRANTES NOS EUA PODEM SE BENEFICAR DE NOVA LEI DE IMIGRAÇÃO

 

Reforma de Biden pode beneficiar milhares de imigrantes brasileiros

Com proposta elaborada pelo presidente americano, maioria dos 11 milhões de indocumentados que vive nos EUA ganharia um caminho para cidadania; obtenção de visto de trabalho e de green card também poderia ser facilitada

Thaís Ferraz, Beatriz Bulla e João Paulo dos Santos, especial para o Estadão

Apresentada ao Congresso na semana passada, a ambiciosa proposta de reforma migratória do presidente Joe Biden pode beneficiar milhares de imigrantes brasileiros, legais ou indocumentados, que já estão nos EUA ou ainda pretendem ir. A nova legislação, chamada de “Ato de Cidadania dos EUA de 2021”, propõe um caminho de oito anos para a legalização de imigrantes que vivem no país.

A proposta também facilitaria a obtenção de green card e reduziria o caminho para a cidadania para os “dreamers”, como são chamados os imigrantes sem documentos que chegaram aos EUA ainda crianças, acompanhando os pais.

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Solicitante de asilo abraça voluntária de igreja ao chegar a Brownsville, no Texas; muitos imigrantes aguardavam no México para pode entrar Foto: John Moore/Getty Images/AFP

O governo americano estima que ao menos 11 milhões de pessoas vivam ilegalmente no país. Dados mais recentes do Pew Research Center indicam que, em 2017, pelo menos 160 mil brasileiros estavam ilegais. Gabriela Ribeiro, de 28 anos, chegou a Newark, em New Jersey, em 2019. Formada em administração, vendeu a empresa que tinha com o marido e viajou para os EUA. “Não viemos para cá pensando em ficar ilegalmente. Queríamos ficar seis meses, estender nosso visto por mais seis meses e ver como seria”, conta. Mas, uma vez no país, o casal avaliou que não era vantajoso voltar.

Moradores de uma “cidade-santuário”, onde a legislação local protege a comunidade de imigrantes ao bloquear o repasse de informações de agências locais ao ICE, o serviço de imigração federal, Gabriela e o marido levam uma vida normal, trabalham e pagam impostos. Ainda assim, ela vê uma mudança significativa. 

“Com Trump, não havia esperança de legalização, pois não existia nenhuma medida a ser votada que fosse a favor dos imigrantes. E era difícil conviver com isso, porque tenho família no Brasil que desejo muito rever”, conta. 

Embora os critérios de elegibilidade para o processo de legalização ainda não estejam claros, ela pretende se candidatar. “Desde que Biden assumiu a presidência, já venho me preparando para tentar a legalização assim que a reforma for aprovada”, diz. “Minha documentação está toda atualizada, as taxas estão em dia e já tenho uma reserva financeira para este fim, como me orientou um advogado de imigração.”

Heloísa Pereira, que também vive em New Jersey, tinha 42 anos quando foi demitida de um cargo administrativo na Fiat, em 2002, e se mudou para os EUA. “A única forma de me legalizar seria através de um casamento com um cidadão americano. Mas não aconteceu de eu me casar de verdade e não me caso se for de mentira. Em New Jersey, se paga US$ 20 mil por um casamento falso. Eu não tenho coragem de mentir para o juiz”, diz.

Em Newark, onde vive, e em Nova York, onde trabalha, ambas cidades-santuário, Heloísa diz que a rotina de imigrante indocumentada é como qualquer outra. Trabalha de baby-sitter de famílias ricas, paga impostos, tem crédito no banco e vai ao hospital quando precisa sem medo de deportação. 

A maior mudança que a legalização de status deve trazer será a chance de sair e entrar nos EUA livremente. Há 18 anos, desde que chegou, ela nunca mais voltou a Minas Gerais para visitar a família. “A legalização será nosso passaporte para a liberdade de ir e vir para outros países. Minha situação é privilegiada, porque tenho irmãs e sobrinhos que têm visto americano e podem me visitar. Mas a maioria dos imigrantes deixou filho, pai e mãe para trás, de famílias mais pobres, e não podem nunca mais ver a família. Para eles, é um desespero.” 

Desde que chegou, Heloísa disse já ter visto outros governos, como o do republicano George W. Bush, tentarem reformar o sistema de imigração e legalizar a vida dos imigrantes. Por isso, tem um otimismo moderado com a proposta de Biden. 

“Honestamente? Acredito que alguma coisa vai ser feita, mas a proposta é muito ambiciosa. É preciso de apoio no Congresso. Sei que ele tem de propor um plano bem ambicioso para aprovar algo menor, porque é assim a política. Mas acho difícil que seja uma anistia tão ampla quanto prometem.”

Se a reforma for aprovada, imigrantes na situação de Gabriela e Heloísa poderão receber um green card após cinco anos, se cumprirem alguns requisitos, como verificação de antecedentes. Após esta etapa, terão direito a solicitar a cidadania em três anos.

Beneficiários do Daca participam de evento no Congresso dos EUA para pedir a aprovação de lei para evitar a deportação de cerca de 800 mil jovens beneficiados pelo programa
Beneficiários do Daca participam de evento no Congresso dos EUA para pedir a aprovação de lei para evitar a deportação de cerca de 800 mil jovens beneficiados pelo programa Foto: EFE/SHAWN THEW

Imigrantes sob a proteção do Daca (Ação Adiada para Chegadas na Infância) também seriam beneficiados com a reforma. Implementado em 2012 pelo então presidente Barack Obama, o programa regulariza temporariamente imigrantes em situação ilegal que chegaram aos EUA quando eram menores, concedendo vistos de estadia e trabalho por dois anos, que podem ser renovados. De acordo com o governo americano, 5.780 brasileiros estão sob status de proteção Daca.

João Paulo Machado Silva, de 25 anos, é um deles. Ele chegou aos EUA quando tinha 8 anos. “Ser dreamer me ajudou muito, porque me permitiu estudar no país e dirigir, mas há um lado negativo: não posso trabalhar em cargos públicos nem viajar para fora dos EUA”, disse.

Se a reforma for aprovada, João Paulo e outros dreamers serão imediatamente elegíveis para solicitar um green card e terão um caminho de três anos para a cidadania.

Estudante de direito, João Paulo está otimista com a perspectiva. “Muitas pessoas, como meus pais, estão aqui há muitos anos e não conseguem nem ver a família há muito tempo”, conta. “Todos os imigrantes estão contando (com o novo governo) para se tornarem cidadãos do país”.

Especialistas ouvidos pelo Estadão dizem acreditar que a reforma também possa facilitar a obtenção de vistos de trabalho e de investidor. “Mesmo as pessoas que são reconhecidas como portadoras de alto conhecimento técnico vinham encontrando muitas dificuldades para imigrar nos últimos quatro anos”, afirma Carolina Carnaúba, diretora da PwC Brasil, acrescentando que a pandemia tornou o processo ainda mais difícil.

Hoje, o número de vistos de imigração com base em emprego é limitado a 140 mil por ano. A proposta de Biden, que havia sinalizado durante a campanha o desejo de expandir o número de vistos de alta qualificação e acabar com os limites vigentes no país, abre caminho para recuperar vistos não utilizados, reduzir longas filas de espera e eliminar limites de visto por país.

Biden também indicou a possibilidade de facilitar o caminho de recém-formados em programas de doutorado STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática) nos EUA, e de fornecer autorização de trabalho para os dependentes de portadores de vistos H-1B, que permite que empregadores americanos contratem temporariamente trabalhadores estrangeiros em ocupações especializadas.

“Ainda não sabemos se existirão outras regras que facilitam investimentos estrangeiros nos EUA ou um status diferencial para mão de obra qualificada, mas há uma predisposição mais favorável ao imigrante do que nos últimos quatro anos”, afirma Carnaúba.

Longo caminho

Com a proposta, Biden dá um passo em direção a uma de suas promessas mais importantes, a modernização do sistema de imigração americano. Se aprovado, o projeto fará a maior mudança na lei de imigração em mais de três décadas – a última, que beneficiou 3 milhões de imigrantes ilegais, aconteceu em 1986, durante o mandato de Ronald Reagan.

A proposta sinaliza uma mudança radical em relação a Trump – que, em quatro anos de mandato, assinou mais de 400 ações executivas que endureceram as regras de imigração.  Também é um contraste significativo com o governo Obama, do qual Biden foi vice, duramente criticado por deportar mais de 3 milhões de imigrantes e não abordar a imigração quando os democratas controlavam a Câmara dos Deputados, o Senado e a Casa Branca.

EUA - Imigração - crianças - Donald Trump
Criança em centro de detenção de imigrantes em Tucson, Arizona  Foto: Mandel Ngan/AFP

“Os governos Obama e Trump não foram governos de extrema ruptura, como muita gente pensa”, explica o professor de Relações Internacionais da PUC-SP Arthur Murta. “Com Trump vimos recrudescimento, mas a administração de Obama não foi pró-imigração. Nunca tantas deportações foram feitas como naquele período”, afirma.

Para Murta,  uma das principais diferenças entre Obama e Trump era o discurso. “Obama não tinha retórica anti-imigração, mas tinha políticas anti-imigração. Já Trump tinha os dois”, afirma. Nesse sentido, a mensagem de Biden é clara. “Com as medidas tomadas até agora, Biden quer mostrar que sua retórica – 100% a favor da imigração – terá lastro”, afirma. “Se essa mensagem vai se converter em uma política de fato, ainda é cedo para dizer”.

A reforma não tem um caminho tão fácil pela frente. Embora os democratas tenham maioria na Câmara e o Senado esteja dividido em 50-50 com desempate nas mãos da vice-presidente, Kamala Harris, a aprovação do projeto exige a conversão de 10 republicanos.

Para Carolina Carnaúba, diretora da PwC Brasil, medidas focadas em vistos de emprego podem dar aos democratas poder de barganha no Congresso. “O Senado tem uma posição diferente da Câmara, onde Biden tem uma maioria ampla. Se por um lado a Câmara tem uma visão mais humanitária, por outro o Senado deve trazer a questão de reconhecimento de obra qualificada”, afirma. “Os senadores devem olhar com perspectiva mais favorável às políticas migratórias que visam vistos de trabalho”

Para o advogado Felipe Alexandre, fundador da AG Immigration, alguns pontos são mais complexos. “Hoje, se um imigrante tem registro criminal, mesmo que ele tenha feito tudo para se reabilitar, isso continua constando na ficha e pode resultar em deportação”, explica. “A proposta de lei, por outro lado, prevê que se a pessoa é condenada, mas passa por um programa de reabilitação, esse registro seria anulado. É uma medida política, e com certeza a oposição vai lutar contra ela”.

Outra medida que pode gerar polêmica, acredita Felipe Alexandre, diz respeito à ampliação de fatores que serão analisados na hora de uma decisão. “A proposta quer dar mais discrição para que oficiais e juízes de imigração considerem mais circunstâncias”, explica. “Se aprovada, eles devem considerar fatores como a ausência de registro criminal ou a gravidade do crime cometido, quais são os laços do imigrante com a comunidade, se ele trabalha e paga impostos, se tem família nos EUA”.

Para o advogado, o tempo necessário para a aprovação da reforma vai depender “do espírito de cooperação”. “Têm sido quatro anos bem polarizados. Se esse espírito continuar, nada passará”, afirma. “Os dois lados terão de conversar e perceber que a reforma vai beneficiar tanto democratas quanto republicanos. Não é impossível, não é super difícil – se formos analisar, o impeachment, que era muito mais polêmico, mostrou que é possível ter diálogo – mas é um desafio”.

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Homem cruza o Rio Suchiate, que divide México e Guatemala. Foto: Isaac Guzman/ AFP

Três perguntas para…

Arthur Murta, professor de Relações Internacionais da PUC-SP

1. Qual foi o tamanho do impacto da transição do governo Obama para o governo Trump, em termos de políticas migratórias? E qual está deve ser o impacto dessa transição entre Trump e Biden?

A transição entre os governos Obama e Trump não foi de extrema ruptura, como muita gente pensa. Durante o governo Trump, é claro, houve recrudescimento de políticas contra imigração, muitas violações de direitos humanos, mas o governo de Obama também não foi um governo pró-imigração. Nunca tantas deportações foram feitas como durante o governo Obama.

Com a repercussão negativa, Obama iniciou uma política de ajuda internacional para os países da América Central, com foco nos países do triângulo norte, Honduras, Guatemala e El Salvador, depois de muito tempo sem nenhuma política voltada às causas raízes da imigarção, como a violência, a desigualdade e a corrupção que levam as pessoas a saírem desses países. E é importante lembrar que é desses países do triângulo norte, que foram profundamente explorados pelas empresas norte-americanas no início do século XX, que saem a maioria dos imigrantes para os EUA. Essa estrutura toda é derivada de outras ações históricas dos EUA na região.

2. A administração Obama, com Biden como vice, adotou algumas medidas duras – como a deportação de 3 milhões de pessoas, a abertura de processos contra milhares de imigrantes e o aumento no número de detenções de famílias na fronteira sul. Como presidente, Biden conseguirá se livrar desse legado?

A política do governo Obama era também uma política de deportação, que ele tentou reverter com o pacote de ajuda externa. O governo Trump endureceu o que já vinha acontecendo, principalmente porque adotou uma retórica anti-imigração. A retórica de Obama não era anti-imigração, mas as políticas eram. Trump tinha as duas.

O governo Biden, por sua vez, já apresentou uma mudança: a retórica, que agora é 100% pró-migrante. No entanto, ainda é muito cedo para falar sobre mudança de política.

As políticas de Trump também deixaram um legado muito negativo. Biden já reverteu as medidas mais duras, mas muitos imigrantes ficarão num limbo jurídico. Biden terá trabalho para resolver todos os problemas que foram criados pela administração Trump.

3. Quais mensagens passam as primeiras decisões de Biden sobre a imigração – principalmente a assinatura das ações executivas em janeiro e a proposta apresentada ao Congresso na semana passada?

Vejo o governo Biden como um governo que teve uma mudança retórica importante, positiva, porque hoje o discurso é muito mais pró-imigração. Mas ainda não podemos chamar o governo Biden de pró-imigração. É cedo. 

Algo que Biden ainda não deixou claro é qual será o papel do México nisso. O governo Trump teve uma postura devastadora em relação ao México, ameaçando aumentar tarifas se o país não freasse caravanas de migrantes antes da fronteira com os EUA. Era quase um sistema de retaliação cruzada, e o México se tornou um país-chave durante toda essa crise migratória, principalmente em 2019. É importante esperar para ver qual será a posição do governo Biden em relação ao México. São muitas questões em aberto.

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