‘Orçamento de guerra’ pode ter vacina contra ‘estado de sítio’ de
Bolsonaro
Adriana Fernandes, Idiana Tomazelli e
Emilly Behnke
BRASÍLIA - A Proposta de
Emenda à Constituição (PEC) do “orçamento de guerra” com
o objetivo de agilizar os recursos para o combate da crise do novo coronavírus,
que foi entregue na terça-feira, 24, às lideranças da Câmara,
contém duas permissões atualmente previstas apenas quando é decretado o estado
de sítio.
© Ernesto Rodrigues/Estadão Congresso Nacional
Durante a vigência da emenda e exclusivamente por
razões relacionadas à saúde pública, o Comitê de Gestão da Crise poderá
determinar a requisição temporária de bens e serviços ou propor ao Congresso
que decrete a obrigação de permanência de pessoas em localidade a ser
determinada.
O Estado teve acesso à minuta da PEC e
apurou que o artigo com as duas medidas foi incluído pelo grupo técnico que
elaborou a proposta, a pedido de deputados, como uma espécie de “vacina” à
possibilidade de o presidente Jair Bolsonaro
usar no futuro, no caso de agravamento da crise, a calamidade como pretexto
para decretar estado de sítio. Nessa situação, que precisa ser aprovada pelo
Legislativo, são suspensas garantias constitucionais, como sigilo de
comunicações, liberdade de imprensa e liberdade de reunião.
Técnicos que participam da elaboração do texto
disseram à reportagem que o artigo cria “amarras” para impedir que Bolsonaro
force a decretação do estado de sítio alegando questões de saúde pública. O
sinal amarelo acendeu depois que o presidente disse, na sexta-feira, que
“ainda” não considera decretar estado de sítio por causa da pandemia.
Autoridades do Legislativo e do Judiciário, no entanto, ficaram preocupadas com
a menção pelo presidente dessa possibilidade.
A versão da PEC ficou pronta na segunda-feira. O
texto foi apresentado à equipe econômica, que negocia alterações. Líderes de
partidos no Congresso só receberam a minuta ontem, o que causou insatisfação
principalmente dos parlamentares dos partidos do chamado Centrão.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), no
entanto, afirmou que o texto da PEC está sendo arredondado e que a intenção é
votá-lo hoje. Maia disse ter tido uma “reação positiva” dos agentes econômicos
com quem conversou sobre a proposta. “A gente não pode enfrentar a crise
contaminando o futuro, nós temos de tratar a crise de forma objetiva”, disse.
Para Maia, o “orçamento de guerra” trará “mais
transparência, agilidade e garantia jurídica” para a tomada de decisões no
contexto de crise. “Pode ser um caminho importante para garantir celeridade e a
certeza que vai ter recurso para o enfrentamento da crise na área de saúde, na
área econômica, principalmente na área social, em relação à econômica”, disse.
Um grupo de parlamentares, porém, defende que
ajustes no decreto de calamidade pública, já dariam condições para agilizar a
execução dos gastos, mas a área técnica tem dúvidas.