Rodrigo Maia e Paulo Guedes
transformam crise do coronavírus em campo de batalha política
© ADRIANO MACHADO
(Reuters) Bolsonaro e Guedes no dia 20 de fevereiro, em Brasília.
O combate à disseminação do coronavírus
virou uma batalha política em Brasília. Se não bastasse o presidente Jair Bolsonaro e seu entorno
quererem confrontar os meios de comunicação sobre a divulgação de boatos sobre
sua contaminação pelo vírus, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia
(DEM-RJ), e o ministro da Economia, Paulo Guedes, entraram em
rota de colisão e teceram críticas um ao outro.
O primeiro a disparar foi Maia. Na quinta-feira, depois que o Ministério da Economia
anunciou cinco medidas financeiras para tentar amenizar a contaminação, o
deputado falou que as propostas eram tímidas: “Guedes não tinha uma coisa
organizada ou não quis falar. Se olhar os projetos, tem pouca coisa que impacte
a agenda de curto prazo ou quase nada”. A afirmação foi feita ao jornal Folha
de S. Paulo.
As cinco medidas da economia anunciadas oficialmente foram: antecipação
da metade do 13º salário de aposentados e pensionistas, suspensão da prova de
vida dos beneficiários do Instituto Nacional
de Seguro Social (INSS), redução dos juros do empréstimo consignado,
redução de impostos sobre importação de produtos médico-hospitalares e maior
agilidade na liberação desses produtos importados nas alfândegas.
Já nesta sexta-feira, provocado por jornalistas
sobre a fala de Maia, Guedes fez uma promessa: disse que até segunda-feira o
Governo apresentará novas propostas. Pincelou duas delas: o reforço da atuação
de bancos públicos e um possível adiamento do pagamento de impostos por
empresas em dificuldades. “O presidente da Câmara está pedindo medidas? Em
menos de 48 horas vamos soltar. Vocês vão ver, de hoje para segunda vai sair
muito mais coisa”.
O clima entre Maia e Guedes esquentou porque, enquanto o Legislativo
discutia maneiras de colaborar no combate à doença, o ministro cobrava empenho
na aprovação de reformas econômicas. Sendo que as duas principais delas, a
administrativa e a tributária, nem foram enviadas pelo Executivo ao Congresso.
A gota d’água foi a derrubada do veto presidencial ao aumento de gastos com o Benefício
de Prestação Continuada, na quarta-feira. A União passará a gastar até 20
bilhões de reais a mais ao ano com a mudança na regra aprovada pelos
legisladores.
Logo após a derrubada do veto, Guedes, e o ministro da Saúde, Luiz
Henrique Mandetta, foram chamados para uma reunião de emergência na Câmara com
Maia e o presidente do Senado, Davi
Alcolumbre (DEM-AP). Os parlamentares os convidaram para tratarem do
combate à doença. Mas Guedes queria falar sobre articulação política. “Eu não
estava elaborando um plano para o coronavírus. Eu estava em apoio às
lideranças, porque nós do governo havíamos sofrido uma derrota do ponto de
vista de estabilidade. Vocês veem a bolsa caindo, o dólar subindo, tudo isso é
um problema nosso, de articulação política. É hora de união", afirmou a
jornalistas nesta sexta-feira.
De onde tirar dinheiro
Na atual crise, o nó econômico é um dos mais difíceis de desatar nesse
momento. Vários países do mundo, da Itália à Espanha passando pelos
Estados Unidos, anunciaram pacotes de ajuda financeira também a
empreendedores e pequenos negócios. A crise do coronavírus tem derrubado bolsas
de valores ao redor do mundo inteiro e prejudicado a produção industrial, o
turismo, o comércio e os serviços. Nesta semana, a Bovespa registrou dois dias com “circuit
breakers”, que são interrupções obrigatórias após quedas
vertiginosas das ações. Na quinta-feira, a bolsa despencou 14,78%, a maior
redução em 22 anos. Conforme especialistas, todos os ganhos obtidos durante o
primeiro ano do Governo Bolsonaro se perderam desde que o vírus começou a se
disseminar e a interferir na economia, com o fechamento de indústrias, férias
coletivas de funcionários e o cancelamento de eventos.
Em nota, o ministério, comandado por Paulo Guedes, afirmou que está
buscando alternativas junto ao Legislativo. “Neste momento crítico, mesmo
diante do exíguo espaço fiscal, o Ministério da Economia buscará, em conjunto
com a Câmara dos Deputados e o Senado Federal, a realocação ágil de recursos
orçamentários para que não falte suporte ao sistema de saúde brasileiro”. Uma
alternativa para engordar o caixa do Governo é destinar parte das emendas de
deputados e senadores ao orçamento para o combate ao coronavírus. Conforme o
relator da lei orçamentária, Domingos Neto (PSD-CE), o ministro da Saúde, Luiz
Henrique Mandetta, solicitou a destinação de 4,8 bilhões de reais ao
Legislativo. Os recursos seriam divididos entre o custeio de serviços de
assistência hospitalar e ambulatorial e o incremento da atenção básica. Segundo
Neto, os parlamentares concordaram em ceder o valor. Esses recursos, contudo,
devem demorar alguns dias para serem liberados para União. Há duas
possibilidades para a liberação desses valores: por meio de uma medida
provisória ainda a ser editada ou pela votação do PLN04/20, um projeto de lei
enviado pelo Executivo que discute a destinação das emendas impositivas. Essa
última alternativa pode mais atrapalhar do que ajudar, não há acordo com o
Congresso.