Coronavírus
afeta variação nos preços do barril de petróleo no mundo
Agência Brasil
A turbulência dos
preços do barril do petróleo esta semana é uma consequência de um cenário que
vem se construindo desde meados do ano passado, embora não com a velocidade e a
violência que se nota agora, a partir da pandemia do coronavírus. A análise foi
feita à Agência Brasil pelo pesquisador do Instituto de Estudos
Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (INEEP), Henrique
Jager.
“Desde meados do ano
passado, o preço do barril do petróleo vem se apresentando com alta
volatilidade e uma tendência de queda, por conta de uma percepção do mercado de
que a oferta estava crescendo em um ritmo maior do que a demanda”, disse o
pesquisador.
Segundo pesquisador,
esse movimento pode ser atribuído ao incremento da pesquisa e exploração do
petróleo ocorrido entre 2005/2008, levando o preço do barril do produto a
atingir, em 2010, perto de US$ 140. A consequência foi o aumento na oferta.
China
Outro fator que
impactou no mercado internacional de petróleo foi a China, grande importadora
de petróleo no mundo, cuja economia vinha evoluindo à taxa de 9% ou 10% ao ano
e reduziu para 5% a 6% ao ano. “E agora, com o coronavírus, no primeiro
trimestre de 2020, as estimativas são de redução da ordem de 20% no consumo do
maior importador de petróleo”. Jager acrescentou que, no Japão, a redução da
demanda no curto prazo deve alcançar quase 22%. “Claro que isso tem impacto no
preço”, afirmou.
A Organização dos
Países Produtores de Petróleo (Opep) tentou fazer uma redução na produção, mas
não conseguiu fechar um acordo nesse sentido nem dentro da própria entidade
nem, principalmente, entre a Rússia e a Arábia Saudita, que são os dois grandes
exportadores mundiais de petróleo. Sem acordo, a Arábia Saudita decidiu manter
a decisão de aumentar a produção. “E os preços despencaram de uma hora para a
outra, por falta desse acordo entre Arábia Saudita e a Rússia”.
Como os preços já
vinham caindo neste primeiro trimestre do ano em curso, a tendência de queda se
acentuou na última semana devido à crise do coronavírus e, também, pela leitura
de uma oferta maior que a demanda. Segundo analisou o pesquisador do INEEP,
trata-se de uma questão conjuntural “porque o coronavírus vai passar”.
Henrique Jager disse
que, de modo geral, há a percepção de que os preços vão recuperar parte da
perda no médio prazo. “Mas, no longo prazo, os preços devem se manter com uma
volatilidade grande”. Ontem à tarde, o valor do barril estava em US$ 36,17 (-
2,9%) para o petróleo tipo Brent e US$ 33,36 (- 2,9%) o petróleo WTI. O
petróleo WTI (‘West Texas Intermediate’) é o comercializado na Bolsa de Nova
York e referente ao produto extraído principalmente na região do Golfo do
México. Já o Brent é comercializado na Bolsa de Londres e tem como referência o
petróleo extraído no Mar do Norte e no Oriente Médio. A expectativa é que os
preços do barril não retomem o patamar de meados do ano passado, da ordem de
US$ 60 a US$ 70, e fiquem em torno de US$ 50, considerando uma recuperação
rápida da economia da China, “o que a gente não vislumbra”.
Recessão
De acordo com o
pesquisador, isso vai depender muito do ritmo de retomada das demais economias
do mundo. Destacou que a crise do coronavírus está saindo da China e entrando
de forma muito pesada na Europa e Estados Unidos. Henrique Jager avaliou que
como as empresas de energia têm peso grande na taxa de investimento da economia
norte-americana, a redução do preço do petróleo vai diminuir o capital
disponível para investimento e isso vai ter impacto forte na economia como um
todo daquele país. Alguns economistas já começam a apontar que o risco de
recessão para a economia americana é muito grande.
“As empresas de
petróleo vão ter dificuldade para pagar suas dívidas e, consequentemente, vão
diminuir suas taxas de investimento”. Como o setor de energia é muito
importante para os Estados Unidos, a possibilidade é haver grande impacto na
economia americana como um todo nos próximos meses. “Você tem impacto por um
lado, porque a economia para, por causa da doença, mas isso pode se estender a
depender disso (vírus), porque você vai descapitalizar as empresas de petróleo,
que têm um peso importante na economia americana”.
Brasil
O cenário pode ser
aplicado também no Brasil, no caso da Petrobras, analisou o pesquisador do
INEEP. “Se o preço ficar na casa dos US$ 30 por muitos meses, isso vai afetar
muito fortemente a Petrobras”, afirmou. Indicou que a estratégia que a
Petrobras vem adotando nos últimos dois a três anos de concentrar as atividades
em exploração e produção (E&P), vai contra a posição de ser uma empresa
verticalizada, atuando em vários setores da economia, como ocorria até então.
Como o petróleo é o
principal produto da empresa, a queda do preço internacional tem impacto
negativo sobre a companhia. “Como você está focando todo o seu esforço em
E&P, acaba ficando mais fragilizada do que as demais companhias de
petróleo”, disse Jager. Esclareceu que as grandes companhias internacionais têm
um peso grande no petróleo, mas atuam também na petroquímica, no refino, em
logística, na busca de energias alternativas, por exemplo. E a Petrobras está
se desfazendo de todas as suas empresas nessas áreas, bem como na distribuição,
explicou.
Jager disse que se o
preço do barril do petróleo cai muito, o preço do produto na bomba de gasolina
não cai, porque a empresa não repassa toda a queda. O mesmo ocorre em um
cenário de alta do preço. Nesses casos, os setores de refino e petroquímica
atuam como fatores anticíclicos, ou seja, quando o preço do barril do petróleo
cai, os preços destes produtos caem menos, ajudando a preservar a margem de
lucro da empresa, e vice-versa. Ao se desfazer de participação nesses setores,
a Petrobras está aumentando sua fragilidade no quadro internacional de baixa de
preço do barril do petróleo que está apontado no horizonte de curto e médio
prazo.