Comissão Especial devolve
benefício ao setor rural e retira R$ 84 bi da Previdência
Adriana Fernandes, Eduardo Rodrigues e Camila Turtelli
© Gabriele Biló/Estadão
Relatório foi aprovado por 36 votos a favor e 13 contrários
Passava de 2h da madrugada desta sexta-feira, quando os deputados
aprovaram requerimento (sugestão de mudança de um ponto específico) apresentado
pelo bloco formado pelos partidos PP, MDB e PTB. O texto mantém a isenção da
alíquota de 2,6% sobre a comercialização de produção agrícola como contribuição
previdenciária, desde que parte seja exportada.
O destaque também retira a trava que impedia o perdão da dívida do Funrural, a
contribuição paga pelo produtor rural para ajudar a custear a aposentadoria dos
trabalhadores.
A aprovação por 23 a 19 do destaque significa um recuo de quase
R$ 84 bilhões na economia prevista com a reforma da Previdência, que
perdeu a marca de R$ 1 trilhão tão perseguida pelo ministro da Economia, Paulo
Guedes. Agora, em dez anos, a proposta, se aprovada, economiza R$ 987,5
bilhões.
Na quinta-feira, 4, Bolsonaro reforçou sua “lealdade” à bancada
ruralista, em café da manhã com deputados da Frente Parlamentar da Agropecuária
(FPA). “Como deputado, em 100 % das vezes votei acompanhando a bancada
ruralista. E vocês sabem que votar com bancada ruralista é quase como parto de
rinoceronte, recebendo críticas da imprensa de organizações não governamentais
e de governos de outros países”, afirmou. “Eu e Ramos (presidente da Comissão
Especial da reforma da Previdência) devemos lealdade a vocês que nos colocaram
no Palácio. Continuamos juntos”, concluiu ao fim do discurso.
O benefício ao setor rural foi o último destaque que precisava ser
avaliado pela comissão. O relatório da reforma da Previdência foi aprovado no
começo da tarde de quinta, por 36 votos a 13 na Comissão Especial.
Após ser aprovada na comissão, a proposta de emenda à Constituição (PEC)
segue para o plenário da Câmara, onde terá de passar por dois turnos de votação
e necessitará do apoio de ao menos 308 dos 513 deputados. Depois, se aprovada,
vai para o Senado.
Considerada a principal aposta da equipe econômica do governo para o
equilíbrio das contas públicas, a reforma da Previdência modifica as regras de
aposentadoria para funcionários do setor privado e servidores públicos da
União.
O texto propõe que os homens só poderão se aposentar aos 65 anos e as
mulheres, aos 62 anos, com um tempo mínimo de contribuição, de 20 anos (homens)
e 15 anos (mulheres). A modalidade da aposentadoria por tempo de contribuição –
que exige tempo mínimo de 35 anos (homens) e 30 anos (mulheres) vai acabar,
caso a reforma seja aprovada da forma como está.
Os novos critérios valerão para quem ainda não começou a trabalhar. Quem
já está trabalhando e contribuindo para o INSS ou o setor público terá regras
de transição.
Além do fim da taxação sobre as exportações agrícolas (que caiu depois
com a aprovação do destaque), o relator incluiu o aumento de impostos sobre
bancos para aumentar o valor da economia esperada em dez anos.
Houve uma tentativa de incluir a previsão de que a reforma também
valesse para servidores estaduais e municipais, mas não houve acordo.
“Nós esperávamos um resultado maiúsculo. Foi um pouco maior até do que
os cálculos que nós tínhamos. Pensávamos em 34 e [tivemos] 36 votos, o que
demonstra aí, eu acredito, uma possibilidade de que isso possa ser replicado no
plenário da Câmara. Há um ambiente favorável”, afirmou o secretário especial de
Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, o ex-deputado Rogério
Marinho.
Depois da votação, o relator Samuel Moreira (PSDB-SP) defendeu a
necessidade de inclusão dos Estados e municípios na reforma da Previdência. “A
meu ver, nós precisamos lutar para que eles [Estados e municípios] entrem na
reforma ainda”, disse.
O relator também mencionou a atuação de categorias de servidores
públicos, que buscavam, nessa reta final de votação na Comissão Especial,
alterar seus regimes de aposentadoria.
“As corporações têm legitimidade, mas sempre à luz da sociedade”,
declarou. “Quem não gostaria de dar novos benefícios? Todos. Mas o momento é de
reajustar a Previdência”.
Policiais
A primeira categoria conseguiu que suas regras para aposentadorias e
pensão permaneçam sob responsabilidade dos Estados. No texto que tinha sido
aprovado, as exigências seriam vinculadas às das Forças Armadas, que ainda
serão analisadas pelo Congresso.
© Babriela Biló/Estadão Destaque que
estendia regras especiais de aposentadoria das Forças Armadas para agentes de
segurança no âmbito da União foi rejeitado e policiais protestaram na Câmara
Com a aprovação do destaque, porém, cada Estado é responsável por suas
regras. A mudança foi considerada benéfica porque em alguns Estados é permitido
a PMs e bombeiros se aposentarem com menos tempo de contribuição do que os 35
anos exigidos pelo projeto que trata da Previdência dos militares federais.
Já os policiais federais, rodoviários federais e legislativos não
conseguiram emplacar o destaque do deputado Hugo Leal (PSD-RJ), que
aproximaria, em parte, as carreiras policiais às regras previstas para os
militares das Forças Armadas.
A sugestão rejeitada previa que a idade mínima para essas categorias
fosse de 55 anos (homem) e 52 anos (mulher). O governo propôs e o texto
aprovado na comissão manteve 55 anos para ambos os sexos. Junto houve a
tentativa de uma regra mais suave para quem já está na carreira, que permitira
se aposentar após trabalhar 17% a mais sobre o período restante para cumprir o
tempo mínimo de contribuição. Essa é a mesma taxa proposta pelo governo para as
Forças Armadas. Na quarta e na quinta, o governo chegou a propor pedágio de
100%, o que foi recusado pelas categorias.
Outros destaques
A Comissão Especial analisou 15 destaques (sugestões de mudanças em
pontos específicos do texto), sendo que aprovou apenas o que retirou a
equiparação das regras dos PMs e bombeiros às das Forças Armadas.
Professores
A Comissão Especial rejeitou destaque do PL que propunha manter
as atuais regras de aposentadoria para professores: sem idade mínima e com 25
anos de contribuição para mulheres e 30 anos para homens. Com isso, fica
mantida a proposta no parecer aprovado pela comissão: idade mínima de 57 anos e
25 anos de contribuição (mulheres) e idade mínima de 60 anos e 30 anos de
contribuição (homens).
Na votação do destaque, Samuel Moreira pediu aos deputados da comissão
que tivessem responsabilidade orçamentária e fiscal. Segundo ele, o destaque
não resolve do ponto de vista social e "destrói" do ponto de vista
fiscal. O texto original do governo previa 60 anos de idade mínima e 30 anos de
contribuição para homens e mulheres.
Após a rejeição do destaque, deputados de oposição levantaram cartazes e
gritaram palavras de ordem, dizendo que o governo é contra a educação.
Pensões
Os deputados da Comissão Especial rejeitaram o destaque apresentado pela
bancada do PCdoB que sugeria retirar do texto a previsão de pagamento de pensão
por morte em valor abaixo do salário mínimo (R$ 998), caso o beneficiário tenha
outra fonte de renda.
A proposta do governo previa uma fórmula de cálculo da pensão que
poderia reduzir o benefício para valores abaixo do salário mínimo.A fórmula
prevê o pagamento de 60% do benefício mais 10% por dependente adicional.
O relator da proposta na Câmara, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP),
alterou o texto duas vezes para fazer uma ressalva: se a pensão for a única
renda de todos os dependentes, não poderá ser menor que o salário mínimo. Com a
rejeição do destaque, esta foi a regra que ficou.
Idade mínima
A Comissão Especial rejeitou sugestão do partido Novo para reincluir na
reforma um gatilho para aumentar a idade mínima de aposentadoria em caso de
elevação da expectativa de sobrevida da população.
A proposta original, enviada pelo presidente Jair Bolsonaro, previa que,
a cada quatro anos, a idade mínima de aposentadoria seria elevada em 75% sobre
o aumento apurado na expectativa de sobrevida do brasileiro aos 65 anos.Para
cada quatro meses de aumento na expectativa, três meses seriam adicionados à
idade mínima proposta pelo governo, de 62 anos (mulher) e 65 anos (homem).
O relatório do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) eliminou o gatilho da
reforma, deixando as idades mínimas fixas, podendo apenas ser alteradas com a
aprovação de nova emenda à Constituição.