Número de
mortos em Brumadinho sobe para 186 e todos já foram identificados
Da Redação
Buscas chegam à
terceira fase, com menos bombeiros e mais máquinas
Subiu para 186 o
número de mortos vítimas da tragédia de Brumadinho, em janeiro deste ano. O
número veio em nova atualização do Corpo de Bombeiros divulgada nesta
quinta-feira (28). Todos os corpos já foram identificados pelo Instituto Médico
Legal (IML).
Agora,
122 pessoas permanecem desaparecidas e as operações de busca estão em sua
terceira fase. O estágio foi anunciado durante uma audiência pública na manhã
de terça-feira (26) pelo comandante-geral do Corpo de Bombeiros de Minas
Gerais, Edgard Estevo da Silva.
Ele ainda explicou
que a fase atual vai representar uma redução no número de bombeiros destacados
para as buscas e no aumento do maquinário - atualmente, são 50 máquinas,
como caminhões e retroescavadeiras -, para que o rejeito seja bem revirado e as
operações possibilitem a procura por corpos a uma distância de até 1,5 metro
embaixo da lama.
Deputados apontaram
problemas na fiscalização de barragens no Brasil, como a fragmentação de
competências, a classificação dos riscos e as falhas na obrigação de imposição
de planos de emergência. O assunto foi debatido nesta quarta-feira (27) em
audiência da comissão especial da Câmara dos Deputados criada para discutir a
segurança dessas estruturas e acompanhar as investigações sobre o rompimento da
barragem de rejeitos da Vale na cidade de Brumadinho, em Minas Gerais.
Os parlamentares
assistiram a uma apresentação do coordenador de Fiscalização de Serviços
Públicos e Segurança de Barragens da Agência Nacional de Águas, Josimar Alves,
que trouxe dados sobre o quadro das barragens no país e argumentou que à ANA
cabe somente a fiscalização de uma pequena parte de tais estruturas.
Segundo o último
relatório sobre Segurança de Barragens da Agência, cuja última edição data de
2017, há 24.092 barragens no Brasil. Destas, 4.500 estão submetidas à Política
Nacional de Segurança de Barragens, sendo 3.543 classificadas quanto ao risco e
5.459 quanto ao dano potencial. Dentro desse universo, 1.220 têm plano de
segurança e 765 contam com plano de ação de emergência.
A fiscalização das
barragens é feita por 31 órgãos, entre nacionais e estaduais. Dentro desse
grupo estão a Agência Nacional de Águas (ANA), a Agência Nacional de Mineração
(ANM) e as secretarias estaduais de Meio Ambiente. Josimar Alves informou que,
deste conjunto, 10 estados ainda não regulamentaram as normas de obrigação de
planos de segurança de barragens e 17 ainda não regulamentaram a exigência de
plano de ação de emergência.
A Agência Nacional
de Mineração também foi convidada para a audiência, mas não enviou
representante, alegando alta demanda e falta de funcionários. A ausência foi
criticada por parlamentares da comissão especial, que indicaram como uma das
recomendações a necessidade de garantia de mais estrutura para essas agências.
“Não adiantou criar uma agência nova. Está sucateada como o DNPM [Departamento
Nacional de Produção Mineral, órgão extinto para a criação da ANM].
A deputada Áurea
Carolina (PSOL-MG) questionou a fragmentação dos órgãos fiscalizadores. Ela
disse que existem lacunas preocupantes no trabalho da ANA, da ANM e dos órgãos
estaduais porque esses são interdependentes. "Talvez tivéssemos que
avançar regulando como se dá a interação entre eles”, afirmou Áurea Carolina.
Ela citou como exemplo barragens de água, fiscalizadas pela ANA, associadas a
estruturas semelhantes de rejeitos, de responsabilidade de secretarias de Meio
Ambiente e da ANM. Esse tipo de estrutura vinculada ocorreu no próprio complexo
da Mina do Feijão, em Brumadinho, completou.
Os parlamentares
criticaram também a forma como as agências e autoridades definem os graus de
risco das barragens. O deputado Júlio Delgado (PSB-MG) lembrou que a barragem
da Vale na Mina Córrego do Feijão havia sido classificada como de baixo risco,
e a de Barão de Cocais, também em Minas Gerais, onde houve uma evacuação dias
depois, não estava na Política Nacional de Segurança de Barragens.
“De 24 mil
barragens, 18% estão na Política Nacional de Segurança de Barragens e mais de
700 não têm plano de emergência. Isso é nada. Como é que a gente fica confiando
numa política de classificação segundo a qual, a que tinha risco baixo se
rompeu, e na outra, que nem estava no plano, as pessoas sobreviveram porque
tocou a sirene?”, indagou Delgado.
O deputado Padre
João (PT-MG) ponderou que, pela constituição dos rejeitos, a barragem da Vale
da Mina Córrego do Feijão não podia ser considerada de risco baixo. “Não era
segura. Pelo próprio conteúdo da lama, ela teria que ser considerada de alto
risco. Nessa de Brumadinho, percebemos o tanto de metais pesados”, lamentou.
Conhecimento
O presidente da
Associação Brasileira de Recursos Hídricos, Adilson Pinheiro, defendeu a
melhoria, dentro dos órgãos fiscalizadores, da capacitação dos agentes
responsáveis por essa avaliação. Segundo Pinheiro, é importante fomentar mais
produção de conhecimento sobre o tema de modo a sofisticar as análises de
risco. “O estabelecimento de padrões e critérios para a política precisaria ser
subsidiado por ações técnicas mais consistentes para que a análise possa ser
feita de forma mais qualificada”, recomendou.
Integração da gestão
A coordenadora da
Rede das Águas da Fundação SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro, ressaltou que a
melhoria da fiscalização e da gestão de recursos hídricos passa pela sua
integração à política de meio ambiente, como era até o ano passado.
“O Sistema Nacional
de Recursos Hídricos preconiza a visão estratégica do meio ambiente, o uso do
solo e a mineração por bacias. Isso tudo estava sob responsabilidade do
Ministério do Meio Ambiente, mas houve uma fragmentação desse olhar global, e a
gestão da água foi repassada ao Ministério do Desenvolvimento Regional”, afirmou.
Em expedição
independente pelo rio Paraopeba e pelas cidades que ele margeia, os
ambientalistas da Fundação SOS Mata Atlântica detectaram que o trecho de pelo
menos 305 quilômetros de sua extensão está morto. Considerando que o curso
d'água tem pouco menos de 550 quilômetros de extensão, isso corresponde a cerca
de 55% de todo o rio.
Os especialistas
iniciaram a expedição no dia 31 de janeiro, seis dias após o rompimento da
barragem I da Mina do Feijão da Vale em Brumadinho, e foram percorrendo o caminho
da lama até o dia 9 deste mês, quando a pluma de rejeitos chegava ao
Reservatório de Retiro Baixo, entre as cidades de Pompéu e Curvelo.
Ao todo, foram
percorridos 2.000 quilômetros por estradas, desde o local do rompimento até
Felixlândia, passando por 21 cidades e contemplando os 305 quilômetros do rio,
trecho afetado pelo rompimento da barragem.
Foram coletadas
amostras de água para análise de qualidade em 22 pontos diferentes, dos quais
10 apresentaram resultado ruim e 12 péssimo. Metais pesados foram encontrados
ali, como manganês, cobre e cromo em níveis muito acima dos limites permitidos
pela legislação. Além disso, 112 hectares de florestas nativas foram
devastados, sendo que 55 hectares eram áreas bem preservadas.
“Os metais presentes
na água nessas quantidades são nocivos ao ambiente, à saúde humana, à fauna,
aos peixes e aos organismos vivos. Eles são reconhecidamente poluentes severos
e podem causar diversos danos aos organismos, desde interferências no
metabolismo e doenças, até efeitos mutagênicos e morte“, afirma Marta
Marcondes, professora e coordenadora do Laboratório de Análise Ambiental do
Projeto Índice de Poluentes Hídricos (IPH), Universidade Municipal de São
Caetano do Sul (USCS).
Para se ter uma ideia, enquanto a norma legal vigente considera segura uma
concentração máxima de cobre na água de rios como Paraopeba em 0,009 mg/L, após
o rompimento, alguns pontos do curso d'água chegaram a concentrar mais de
4mg/L. O contato com a água contaminada pode causar náuseas, vômitos, rigidez
muscular, tremores das mãos e fraqueza.
Conforme aponta
ainda o relatório, a região do Alto Paraopeba, estratégica para a manutenção
dos recursos hídricos da bacia e do rio São Francisco, foi a mais impactada
pelo despejo de 14 toneladas de rejeitos de minério no rio.