Aumenta a população
brasileira na extrema pobreza, e cenário pode piorar
Tatiana Lagôa e
Janaína Oliveira
Aos 65 anos, o aposentado José Félix da Silva passa por muitas
dificuldades para sobreviver com apenas R$ 880 por mês
O achatamento da renda dos brasileiros, provocado pela crise econômica,
agrava uma situação já dramática e faz aumentar o número de pessoas em estado
de extrema pobreza no país. Dados do IBGE mostram que, se em 2014 este grupo
representava 7,9% da população, em 2015, o percentual passou para 9,2%. O
cenário poderá piorar ainda mais nos próximos anos com a política fiscal
adotada pelo governo Temer, apontam especialistas.
De acordo com o levantamento divulgado ontem pela instituição, 17,8% da
população ganhava até meio salário em 2015 e outros 30,3% ficavam na faixa de
renda entre meio e um salário. Em síntese, 57,3% dos brasileiros ganham até um
salário mínimo que, no ano passado, estava em R$ 788. O rendimento médio no
país caiu 7,16% neste período, passando de R$ 1.368 para R$ 1.270. Esse é o
menor valor desde 2011.
“Vivemos o reflexo do aumento do desemprego conjugado com a queda na renda.
A pobreza é agravada porque quem sofre mais na crise são os trabalhadores menos
qualificados e de baixa renda”, explica o vice-presidente do Conselho Regional
de Economia de Minas Gerais (Corecon-MG), Pedro Paulo Pettersen.
Futuro
Especialistas defendem que o desmonte no Bolsa Família, aliado aos
efeitos da PEC 55 – que limita os gastos do poder público pelos próximos 20
anos – no salário mínimo poderá empurrar os mais pobres para a miséria. Desde
que o peemedebista assumiu a Presidência, 1,123 milhão de cadastros do programa
assistencial foram cancelados ou bloqueados (dado de 7 de novembro de 2016).
“O governo propõe fazer o contrário do que seria certo neste momento
recessivo. Com mais pessoas sofrendo as consequências da crise, é preciso que
haja um aumento do assistencialismo”, observa a coordenadora do Centro de
Capacitação e Pesquisa em Projetos Sociais da UFMG, Danielle Cireno Fernandes.
A socióloga explica que, mais do que um programa assistencial, o Bolsa
Família ajuda a girar a economia, com a inclusão de brasileiros no universo do
consumo. Dessa forma, há um fomento às vendas e, consequentemente, geração de
empregos no comércio e na indústria.
Para Pedro Paulo Pettersen, “a PEC dos Gastos vai afetar diretamente a
baixa renda porque, se o salário mínimo não subir na mesma proporção que subia
antes, haverá agravamento da desigualdade social”.
“Acho que o governo tem um grande problema para resolver. De um lado,
precisa mesmo cortar gastos. De outro, precisa fazer de uma forma que não afete
o salário mínimo para que os mais pobres não sofram”
Mauro Rochlin
Professor de economia Fundação Getúlio Vargas
Mauro Rochlin
Professor de economia Fundação Getúlio Vargas
Realidade
Os números do IBGE reforçam o que já sofrem, na prática, brasileiros
como José Félix da Silva, de 65 anos. A aposentadoria que ele recebe, de R$
880, mal dá para o básico. “Pelo menos fome não passo, mas está cada dia mais
difícil sobreviver. Um pacote de açúcar está custando R$ 12. Essa crise pegou a
gente de jeito”, diz ele, que criou 15 filhos trabalhando como pedreiro.
Moradora da ocupação Rosa Leão, na divisa de BH e Santa Luzia, a dona de
casa Liergy de Oliveira Silva, de 21 anos, sonha em ter o básico. “O que eu
queria mesmo era asfalto na rua e piso no chão da minha casa”, conta. O marido
dela está desempregado. “O Bolsa Família seria a salvação, mas a gente não
consegue porque mora na ocupação”, lamenta.