Você sabe fazer boas negociações? Um estudo de Recursos Humanos mostrou que negociar é uma das coisas mais difíceis para os profissionais dos dias de hoje. Negociar é uma tarefa para “mãos úmidas”. Para te ajudar a ter mais sucesso em suas negociações escrevi esse breve artigo (tempo leitura de 1 minuto e meio) com as 07 dicas da arte da negociação praticadas por peritos do FBI que você não pode deixar de conhecer. Leia, só aqui:
Mauro Condé
1. Não seja direto demais – Não basta você ser agradável, você precisa parecer agradável.
Ao invés de ir direto ao ponto e parecer arrogante e ameaçador, comece quebrando o gelo, amaciando a sua voz, os seus gestos e passando uma imagem de calma, segurança e tranquilidade.
Ouça atentamente para gerar simpatia, empatia e harmonia.
2. Não force o outro a dizer “sim” – Psicologicamente, a palavra “sim” tende a estressar a outra pessoa, pois ela sugere a conotação de compromisso e por outro lado a palavra não significa proteção.
“Te liguei numa hora errada?” é melhor que “ pode falar comigo agora? ”, pois permite que a pessoa atenda o que você quer te respondendo com um não sem stress.
3. Escute críticas e acusações e nunca as leve para o lado pessoal – Receber as críticas sem rebatê-las ou levá-las para o pessoal é a forma mais rápida de desarmá-las e passar para a próxima etapa.
4. Faça a outra pessoa se sentir no controle para colaborar mais – Consiga isso fazendo para as pessoas perguntas abertas, como: você gostaria de definir a agenda da reunião?
5. Consiga com que a outra pessoa te diga as palavras mais mágicas em qualquer negociação: “Isso mesmo! Está certo!” – Elas colocam todos no mesmo lado, numa zona de concordância mútua e de boa conexão. Durante a negociação, capte algo importante que a outra pessoa tenha falado, repita-o com suas palavras e perguntando: está certo?
6. Faça escuta ativa – Ouça e busque informações relevantes que possam levar a negociação a um bom fim.
Nunca lute na tentativa de deduzir o que a ele quer, ao invés disso, descubra perguntando diretamente.
7. Pergunte – “Como é que eu vou fazer isto que você está me pedindo?”
Tente envolver a outra parte de forma a fazer com que a ela resolva o problema por você.
Assim ela terá que se colocará no seu lugar e sentirá forçada a gerar soluções e propostas alternativas ou até mesmo fazer concessões para fechar a negociação ou indicar algo além.
(*) Palestrante, Consultor de empresas e fundador do site www.oblogdomaluco.com.br
Para encerrar esse post de forma ainda mais motivadora, deixo você na companhia de 03 obras de arte :
1-VISUAL – Aprecie a pintura:
A luta entre o Carnaval e a Quaresma de Pieter Bruegel o Velho – pintura de 1559
Adoro apreciar esse quadro pela riqueza de seus detalhes.
Ele retrata um festival realizado no sul da Holanda, lá pelos anos de 1550.
No lado esquerdo da pintura vê-se uma pousada, e no lado direito uma igreja.
Esta justaposição é destinada a ilustrar os dois lados da natureza humana:
o prazer e a castidade religiosa, assim como, o contraste entre os dois.
Perto da igreja vêm-se crianças sentadas e bem comportadas.
Perto da pousada estão bêbados barulhentos.
O homem gordo no meio da pintura, com uma torta na cabeça, seria a representação do “carnaval”.
A pintura representa um tema comum na Europa do século XVI, a batalha entre o Carnaval e a Quaresma, e com o seu humor e sagacidade, é uma crítica satírica sobre os conflitos da Reforma.
2-LITERÁRIA – Leia o livro – Negocie qualquer coisa como se sua vida dependesse disso:
Este livro leva você para o mundo das negociações de alto risco e para dentro da mente de Chris Voss, que em sua carreira no FBI se tornou o principal negociador internacional em situações de sequestro.
Um dos mais bem-sucedidos guias de negociação dos últimos tempos, ele ensina nove princípios contra intuitivos para se tornar mais persuasivo na vida pessoal e profissional. Tudo isso combinado a histórias reais e emocionantes da atuação de Voss no FBI.
A vida é uma sucessão de negociações para as quais você deve estar preparado: comprar um carro, pedir um aumento, renegociar o aluguel, debater decisões com a família.
Negocie como se sua vida dependesse disso levará sua inteligência emocional e intuição a outro patamar, lhe dando uma vantagem competitiva em qualquer discussão.
3-MUSICAL – Ouça a música:
O Jazz agradável e relaxante : Lebroba
Andrew Cyrille / Wadada Leo Smith / Bill Frisell
A Plataforma da Startup Valeon é uma excelente forma de negociação entre Empresas e Consumidores.
Com novas variantes do coronavírus, tsunami no Brasil se aproxima
A questão não é quando vão chegar novas cepas, mas qual será a intensidade e o preparo
Fernando Reinach*, O Estado de S.Paulo
Tudo indica que um tsunami vai atingir o Brasil. A Europa e Manaus já estão sofrendo com novas cepas do Sars-CoV-2 que se espalham rapidamente. Elas são difíceis de controlar, aumentam o número de mortes por 100 mil habitantes, e conseguem ludibriar parcialmente o sistema imune dos já infectados e vacinados. A solução na Europa tem sido trancar a população em casa e vacinar em questão de semanas todo o grupo de risco com as vacinas daPfizer e Moderna. E na falta destas, com a vacina da AstraZeneca. A questão não é se esse tsunami vai se espalhar pelo Brasil, é quando isso vai acontecer, qual a intensidade, e se vamos estar preparados.
Número de pessoas que morreram em casa por causa do coronavírus aumentou diante da falta de leitos em UTIs Foto: Edmar Barros/ AP
Para sentir o perigo basta entender um dos trabalhos publicados esta semana sobre as novas cepas. Escolhi o estudo feito pelo grupo de David Ho. Ele é um cientista que você pode descrever em uma frase: Ho transformou a AIDS de uma sentença de morte em uma doença crônica controlável por um coquetel de antirretrovirais. Foi dele a ideia de evitar o aparecimento de novas cepas de HIV usando combinações de drogas. São os coquetéis que usamos até hoje.
O trabalho possui uma quantidade enorme da dados coletados usando uma versão da metodologia que descrevi semana passada. Utilizando técnicas de engenharia genética o grupo de Ho é capaz de construir e testar as propriedades das mais diferentes cepas do SARS-CoV-2. Cada cepa contém uma ou mais das mutações da Inglaterra (B.1.1.7) e da África do Sul (B.1.351). Para a cepa inglesa, além da original que já circula, os cientistas construíram cepas contendo cada uma das 8 mutações mais importantes. Para a cepa da África do Sul, além da própria, foram construídas cepas com cada uma das 9 mutações. De posse dessa coleção, os cientistas mediram sua capacidade de invadir células humanas. Essa medida foi feita na presença e na ausência de anticorpos gerados contra o SARS-CoV-2 original. Esse experimento permite determinar a capacidade de cada anticorpo de bloquear a entrada de cada cepa em células humanas. Anticorpos que evitam a entrada (chamados de neutralizantes) devem proteger a pessoa. Os que não evitam a entrada não devem proteger.
Num primeiro estudo foi averiguada a capacidade de 18 anticorpos monoclonais (como os utilizados para tratar Donald Trump) de neutralizar cada uma das cepas. São 324 experimentos distintos. Em seguida os cientistas repetiram o experimento usando os anticorpos presentes no soro de 20 pacientes que se recuperaram de casos graves e leves de covid-19 causado pelo SARS-CoV-2 original. Isso gerou outra tabela com 360 resultados. Finalmente repetiram os experimentos usando os anticorpos presentes no soro de 22 pessoas que haviam sido imunizadas com a vacina da Pfizer (10 pessoas) e da Moderna (12 pessoas) para verificar se essas cepas conseguiam escapar dos anticorpos gerados por essas duas vacinas. São mais 396 resultados.
Os cientistas conseguiram determinar quais anticorpos neutralizam qual cepa. A primeira conclusão é que a inglesa, B.1.1.7, não é neutralizada por nenhum dos anticorpos dirigidos para a região N-terminal da proteína Spike do SARS-CoV-2 original. Entretanto ela é parcialmente bloqueada pelos anticorpos que se ligam na região que o vírus usa para entrar na célula. Mais importante, a cepa B.1.1.7 é três vezes mais resistente aos anticorpos presentes nas pessoas que tiveram covid-19 causada pelo SARS-CoV-2 original e duas vezes mais resistente aos anticorpos presentes nas pessoas vacinadas. Ou seja, não somente ela se espalha rapidamente, mas parece possuir características que a ajudam a despistar a resposta do sistema imune.
Já a cepa da África do Sul, B.1.351, é muito mais preocupante. Ela não é bloqueada pelos anticorpos monoclonais, é de 11 a 33 vezes mais resistente aos anticorpos presentes no soro de pessoas previamente infectadas e de 6,5 a 8,6 vezes mais resistente que o vírus original aos anticorpos gerados pelas vacinas da Pfizer e Moderna.
A conclusão é de que essas duas cepas, que estão se espalhando pelo mundo, podem tornar inúteis os anticorpos monoclonais que estão sendo desenvolvidos como tratamento e devem ameaçar de forma significativa a eficácia das vacinas. É por esse motivo que a Pfizer e a Moderna já anunciaram que estão desenvolvendo novas versões de suas vacinas.
Esse estudo não analisou a nova cepa de Manaus (semelhante à cepa sul-africana), e não analisou a capacidade das três cepas (Inglaterra, África do Sul e Manaus) de burlar as defesas criadas pelas vacinas Cononavac e AstraZeneca. Ou seja, não sabemos ainda as propriedades da cepa de Manaus nem como as vacinas que dispomos vão se comportar diante dessas novas cepas.
É uma questão de tempo a disseminação dessas cepas pelo Brasil, mas muito provavelmente elas vão chegar antes de vacinarmos uma fração significativa da população. Nos EUA se acredita que elas serão dominantes nas próximas semanas.
Desculpem o pessimismo, mas é melhor apertar os cintos e nos prepararmos para o pior. E lembrem: no início de 2020, quando o coronavírus demorou um pouco mais para chegar ao Brasil, muitos acreditavam que ele não chegaria por aqui.
*É BIÓLOGO, PHD EM BIOLOGIA CELULAR E MOLECULAR PELA CORNELL UNIVERSITY E AUTOR DE A CHEGADA DO NOVO CORONAVÍRUS NO BRASIL; FOLHA DE LÓTUS; E A LONGA MARCHA DOS GRILOS CANIBAIS.
Além de conspurcar o exercício da Presidência e dar o governo ao Centrão, Bolsonaro pode ressuscitar a oposição destrutiva, liderada pelo lulopetismo, que floresce no caos.
Notas & Informações, O Estado de S.Paulo
Em abril do ano passado, o presidente Jair Bolsonaro, durante um dos tantos protestos golpistas que estimulou, esbravejou contra o Congresso: “Nós não queremos negociar nada. Nós queremos é ação pelo Brasil. O que tinha de velho ficou para trás, nós temos um novo Brasil pela frente. Acabou a época da patifaria!”.
Pouco menos de um ano depois, Bolsonaro partiu para a compra explícita de apoio de parlamentares e partidos fisiológicos. Isso nem velha política é, pois no passado, mesmo que a negociação de votos fosse a norma, ainda havia eventualmente algum acordo em torno de projetos em comum. Hoje não mais: o que há é a entrega do governo para a deglutição do Centrão, que se banqueteará de cargos, verbas e poder. Poucas situações representam a época da patifaria como essa.
Repórteres do Estado tiveram acesso a uma planilha de negociação do governo com deputados para angariar apoio à eleição, para as presidências da Câmara e do Senado, dos candidatos apadrinhados pelo presidente Bolsonaro. A reportagem mostra que aquela planilha representa a distribuição de cerca de R$ 3 bilhões para 250 deputados e 35 senadores usarem em obras em seus redutos eleitorais.
Mas esse é seguramente apenas um fragmento da história. Outras fontes garantem que o total de recursos liberados é de cerca de R$ 16,5 bilhões. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, falou em R$ 20 bilhões. Em qualquer dessas contas, o valor destinado aos parlamentares supera, em vários casos, o limite a que cada um deles tem direito a destinar em emendas ao Orçamento.
A reportagem mostra que o gabinete do ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, tornou-se o quartel-general das candidaturas apoiadas por Bolsonaro. Segundo parlamentares ouvidos pelo Estado, o candidato governista à presidência da Câmara, deputado Arthur Lira (Progressistas-AL), orienta os deputados a ir ao gabinete do ministro Ramos e acompanha todas as etapas do processo, negociando conforme seus interesses e envolvendo seus apadrinhados, que já estão em vários postos importantes do Ministério de Desenvolvimento Regional, pasta de onde sai o dinheiro.
Parlamentares dizem que, a portas fechadas, o ministro Ramos sonda a disposição do deputado de votar em Arthur Lira em troca de verbas; se o deputado indica que votará em Lira, seu nome é incluído imediatamente na planilha. Não há outro critério para a liberação da verba – nem técnico, nem ético, nem de interesse público. Ademais, o mecanismo de liberação dos recursos prima pela falta de transparência – é dinheiro “extraorçamentário”, destinado a obras e convênios cujos contratos, em alguns casos, foram assinados às pressas.
Mas a época da patifaria não se limita à transformação do Palácio do Planalto em bodega – onde não se discutem princípios, apenas preços. Bolsonaro está disposto a entregar o próprio governo ao Centrão – e a eleição de Arthur Lira, que na condição de presidente da Câmara terá poder de decidir sobre processos de impeachment e sobre a agenda legislativa, é apenas o primeiro passo dessa rendição.
Bolsonaro em pessoa confirmou essa intenção. Segundo ele, se seus candidatos forem eleitos, “a gente pode levar muita coisa adiante”, inclusive, “quem sabe, até ressurgir Ministérios”.
O presidente que se elegeu prometendo acabar com o loteamento da máquina pública para ter apoio parlamentar agora acha absolutamente normal e até positivo recriar Ministérios e entregá-los aos partidos que colonizam seu governo. E ainda festejou que Arthur Lira – que só assumiu o mandato de deputado em 2018 por força de liminar judicial, depois de condenações em processo por improbidade administrativa, e ainda enfrenta acusações de corrupção – vai se tornar “o segundo homem na linha hierárquica do Brasil”. Ou seja, Bolsonaro já dispensa o vice-presidente Hamilton Mourão sem a menor cerimônia.
A ânsia de Bolsonaro de se manter no poder e de proteger seus filhos encrencados na Justiça já fez muito mal ao País, mas ainda pode fazer muito mais: além de conspurcar o exercício da Presidência e dar o governo ao Centrão, pode ressuscitar a oposição destrutiva, liderada pelo lulopetismo – que sempre floresce no caos. A patifaria, como as desgraças, nunca vem sozinha.
Só com seriedade se fechará o buraco das contas públicas. Falta o presidente aderir.
Notas & Informações, O Estado de S.Paulo
O presidente gasta bilhões em troca de apoio político, o Tesouro financia a farra e o pagador final, o contribuinte, carrega uma dívida bruta, em valor de dezembro, de R$ 6,62 trilhões, ou 89,3% do Produto Interno Bruto (PIB). O setor público deve o equivalente, portanto, a quase toda a produção anual de bens e serviços, incluídos o arroz, o feijão, o milho, os sapatos, automóveis, cortes de cabelo, trabalhos médicos e o leite condensado, muito importante na dieta presidencial e muito útil, segundo o governo, para o vigor das tropas brasileiras. Em um ano a relação dívida/PIB aumentou 15 pontos porcentuais, indicando um desajuste financeiro e econômico só justificável pelo combate à covid-19 e a seus efeitos sociais e econômicos. Encerrado o ano e suspenso o estado de calamidade, é preciso cuidar da volta à normalidade.
Reduzir o enorme buraco nas finanças públicas tem de ser parte desse trabalho. Chegou a R$ 745,27 bilhões, no fim do ano, o déficit primário do governo central. Esse valor, calculado sem a conta de juros, corresponde a 10,06% do PIB estimado para o período. Um ano antes a relação era de 1,20%.
O resultado geral do setor público, atenuado pelos saldos positivos contabilizados em Estados, municípios e empresas estatais, foi um déficit primário de R$ 702,95 bilhões, ou 9,49% do PIB. Somados os juros, o resultado geral, ou nominal, foi um rombo de R$ 1,01 trilhão. Os cálculos são do Banco Central (BC).
Em 12 meses a relação entre o déficit nominal e o PIB mais que dobrou, partindo de 5,79% em dezembro de 2019. A pandemia interrompeu uma firme sequência de reduções. A relação havia passado de 8,98% em 2016 para 7,77% em 2017 e 6,96% em 2018. O ajuste havia começado na administração do presidente Michel Temer, juntamente com o esforço de reativação econômica depois de dois anos de recessão.
A tentativa de correção fiscal continuou em 2019, no início do mandato do presidente Jair Bolsonaro, mas a recuperação da economia foi negligenciada nesse ano e no primeiro trimestre de 2020. Ações de apoio à produção e ao consumo só foram iniciadas seriamente quando se percebeu o desastre econômico ocasionado pela pandemia.
O Banco Central agiu mais rapidamente, com estímulos à expansão do crédito. Executivo e Congresso moveram-se em seguida, com políticas de apoio a empresas, medidas combinadas de proteção do emprego e de redução de custos trabalhistas, auxílio emergencial aos mais vulneráveis e tentativas, nem sempre eficazes, de expansão do financiamento a micro e pequenas empresas.
Gastos muito acima dos valores programados e ações de alívio tributário complicaram a gestão financeira do governo central, mas o esforço limitou a contração econômica e propiciou alguma reação a partir de maio.
A despesa primária do governo central (sem juros, portanto) atingiu R$ 2,01 trilhões no ano passado, com crescimento real de 31,1% em relação ao R$ 1,51 trilhão de 2019. De um ano para outro houve aumento de R$ 477,61 bilhões. Os gastos em resposta à pandemia totalizaram R$ 539,60 bilhões. Consumiram, portanto, a diferença entre o dispêndio total de 2020 e o do ano anterior e mais R$ 62 bilhões. Entre 2015 e 2019 as despesas obrigatórias corresponderam a cerca de 100% da receita líquida. Em 2020 equivaleram a 153%. O dinheiro usado no combate à covid-19 e a seus efeitos foi incluído na categoria das aplicações obrigatórias e, além disso, houve perda de arrecadação.
Muito comprimidas no ano passado, as despesas discricionárias, onde se incluem os investimentos, continuarão reduzidas em 2021. A equipe econômica tentará reduzir amplamente o déficit primário e conter a dívida bruta, muito acima do padrão dos emergentes. Cumprir a regra do teto será possível, se for mantida a disciplina fiscal, diz o secretário do Tesouro, Bruno Funchal. Mas nem sequer há um Orçamento aprovado, o ministro da Economia deve ainda um roteiro claro para 2021 e o presidente Bolsonaro depende de uma base parlamentar faminta de verbas. Falta incluir tudo isso nos cálculos.
Sob risco de demissão, Ernesto Araújo enfrenta tempestade perfeita com China, Índia e EUA
BBC NEWS
Na quarta-feira (27/01), enquanto o vice-presidente Hamilton Mourão afirmava que o chanceler Ernesto Araújo deverá deixar o comando do Ministério das Relações Exteriores em breve, Araújo aplaudia e ria dos insultos que o presidente Jair Bolsonaro disparava contra a imprensa em uma churrascaria de Brasília.
Os eventos podem parecer contraditórios, mas exprimem a encruzilhada no destino de Araújo. O chanceler, visto como um dos últimos representantes da pauta ideológica de Bolsonaro na Esplanada, é também o executor de uma política externa que começa a trazer dificuldades palpáveis aos interesses econômicos e sanitários nacionais.
Nas últimas semanas, isso se traduziu em falta de proximidade diplomática que destravasse o envio da China e da Índia de doses de vacina e de insumos para produzir centenas de milhões de imunizantes no Brasil, além da escassez de pontos de diálogo com o recém-empossado governo democrata de Joe Biden, que já anunciou a agenda ambiental como um dos pontos centrais de seu governo.
Como resultado, a demissão de Araújo virou uma demanda de grupos políticos cada vez mais diversos. Se, por um lado, ele é um ativo ideológico de Bolsonaro, por outro, passou a representar um risco eleitoral em um país com 220 mil mortes na pandemia e em crise econômica.
Essa é a avaliação de quase uma dezena de embaixadores e diplomatas ouvidos pela BBC News Brasil, tanto no país quanto no exterior. A maior parte deles preferiu discutir o assunto anonimamente por receio de retaliações políticas.
“Ernesto Araújo é hoje muito mais uma ponte entre o presidente e seu público doméstico do que um interlocutor para o Brasil na arena internacional”, definiu um deles.
Procurado pela BBC News Brasil, Ernesto Araújo não se posicionou diretamente. O Itamaraty destacou o Secretário de Comunicação e Cultura, embaixador Paulino Franco, para responder aos questionamentos da reportagem. Franco afirmou que não comentaria as declarações de autoridades nem a possibilidade de saída do chanceler.
A respeito do episódio da churrascaria e da relação com Bolsonaro, ele afirmou que “qualquer ministro, independentemente da pasta que ocupe, é, por definição, um ser político e responde ou age de acordo com as escolhas políticas do momento. O presidente Bolsonaro tem o seu programa político, ele foi eleito por esse programa, que de modo simplificado poderia ser chamado de liberal-conservador, e o ministro Ernesto Araújo compartilha essas ideias políticas e é natural que ele faça parte dessas atividades do presidente”.
A tempestade perfeita de Araújo
No xadrez global, a chancelaria de Araújo, diplomata de carreira e ex-aluno do ideólogo Olavo de Carvalho, representou uma quebra com os princípios da diplomacia brasileira de não intervenção em assuntos internos alheios e de independência de posicionamento. O ministro levou o Itamaraty a se posicionar contra o que chamou de climatismo, globalismo e ideologia de gênero.
Na prática, passou a colocar em dúvida dados científicos sobre mudanças climáticas, a criticar organismos de relação multilateral, como a ONU, e a ver na promoção de ações de igualdade de gênero e justiça social uma afronta às liberdades individuais, especialmente a religiosa, e ao conservadorismo cristão que defende.
A cartilha não foi inventada por Araújo — nem por Bolsonaro — mas estava dada pelo então presidente americano Donald Trump, a quem o Brasil se alinhou. De Trump, Araújo também importou a hostilidade à China, maior competidor dos americanos e principal parceiro comercial do Brasil, a proximidade com Israel e a falta de interesse em atuar junto a países emergentes e regionais, entre os quais o Brasil era uma liderança.
E se nos primeiros meses dessa política os posicionamentos geraram polêmica, algumas notas de indignação e surpresa entre aliados, a mudança drástica no cenário internacional com a pandemia e a derrota de aliados do bolsonarismo em disputas eleitorais ao redor do mundo colocaram em xeque as ações de Araújo. A situação se complicou simultaneamente com três dos principais interlocutores globais: China, Índia e EUA.
China: Tereza Cristina, Fábio Faria e Temer em ação
A gestão Bolsonaro adotou posicionamento hostil ao país em diversas ocasiões. Em março de 2020, o deputado Eduardo Bolsonaro afirmou que “a culpa” pela pandemia era da China e, em abril, o então ministro da Educação, Abraham Weintraub, acusou a China de propositalmente gerar a crise sanitária para se beneficiar economicamente, além de ridicularizar o suposto sotaque chinês ao falar português.
O próprio presidente desdenhou da CoronaVac, imunizante contra a covid-19 produzido pelo Instituto Butantan em parceria com a empresa chinesa Sinovac, chamando-a de “vacina chinesa do Doria”, em referência ao governador paulista João Doria (PSDB), com quem antagoniza. E hoje, na prática, o governo federal depende da parceria Sinovac/Butantan, responsável por 8 em cada 10 doses de vacinas autorizadas autorizadas para aplicação no Brasil.
Em novembro, após a derrota de Trump nas urnas, Araújo expressou apoio do Brasil à Aliança Rede Limpa, uma iniciativa da gestão Trump para levar países aliados aos EUA a excluírem de suas redes de telefonia 5G equipamentos de empresas consideradas pouco seguras pelos americanos, como a chinesa Huawei.
Ao comentar o assunto em posts já apagados, Eduardo Bolsonaro endossou Araújo e afirmou se tratar de uma “aliança global para um 5G seguro, sem espionagem da China”. Fez também críticas a entidades “agressivas e inimigas da liberdade, a exemplo do Partido Comunista Chinês”.
A embaixada da China no Brasil, que já vinha repudiando declarações de representantes brasileiros, subiu o tom e ameaçou o país com “consequências negativas” caso Eduardo Bolsonaro e “outras personalidades” não abandonassem “declarações infames que, além de desrespeitarem os fatos da cooperação sino-brasileira e do mútuo benefício que ela propicia, solapam a atmosfera amistosa entre os dois países e prejudicam a imagem do Brasil.”
O Itamaraty respondeu que “o tom e conteúdo ofensivo e desrespeitoso da (nota) prejudica a imagem da China junto à opinião pública brasileira”. Afirmou ainda que as redes sociais não eram ambiente adequado para troca de mensagens de autoridades dos dois países. Três dias depois, o próprio Araújo insinuou no Twitter que a China estava “tentando controlar o mundo” e que não conseguiria.
As relações estavam nesse pé quando, em meados de janeiro, um carregamento de milhares de litros de Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA), fundamental para a fabricação dos imunizantes tanto pelo Butantan como para a Fiocruz, que produzirá a vacina da Oxford/ AstraZeneca, passou vários dias parado no aeroporto de Pequim. No último dia 17, o ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, afirmou que a China “tem colocado barreiras”, “não tem dado celeridade” e que “há movimentos fortes no nível diplomático para encontrar onde está essa resistência e resolver o problema”.
Em resposta, a representação chinesa em Brasília afirmou não haver qualquer motivação política na questão do envio dos insumos.
O Itamaraty reconhece existirem “etapas burocráticas a serem superadas, e que estão sendo superadas”, o que explica por que ainda não foi completamente liberado o carregamento de IFA para a Fiocruz fabricar milhões de vacinas. Do lado da CoronaVac, a atuação de José Mario Antunes, diretor do escritório da InvestSP em Xangai, teria sido importante para garantir o fluxo de remessas da China para o Brasil. O primeiro lote de insumos foi liberado na última segunda-feira.
Diplomatas familiarizados com a negociação na China, no entanto, afirmam que é impossível garantir que os chineses tenham feito algum tipo de retaliação ao Brasil no episódio, mas que diante do impasse burocrático ou comercial o país não tinha canais diretos de diplomacia para desatar o nó.
Dada a falta de interlocução, Bolsonaro pediu um telefonema com o mandatário chinês, Xi Jinping, no último dia 20. Para alguns embaixadores ouvidos pela reportagem, o lance demonstrou mais o desespero do Brasil do que uma possibilidade real de negociação. “Nenhum presidente no mundo atende um telefonema no qual sabe que será pressionado. Por que o Xi Jinping atenderia o Bolsonaro em um momento desses?”, explica um embaixador ouvido pela reportagem.
O Planalto convocou a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, para acionar seus contatos no agronegócio e o ministro das Comunicações, Fábio Faria, para sinalizar uma abertura para retomada de conversas sobre 5G com a Huawei.
Prova da mudança no ambiente foi o resultado do relatório de regras para o edital do 5G, apresentado preliminarmente a Faria ainda nesta quinta, 28. Não deve haver nenhuma barreira à participação da empresa chinesa.
Até mesmo o ex-presidente Michel Temer (MDB) entrou em campo e telefonou para o ex-embaixador chinês no Brasil, com quem tinha boa relação pessoal, para pedir ajuda no assunto.
A reportagem perguntou ao Itamaraty se, diante do impasse, haveria mudanças na postura crítica do ministro à China. “Não se trata de reafirmar ou rejeitar iniciativas que são iniciativas importantes, que dizem respeito às liberdades individuais. Essas são questões caras a diversos países, dentre eles o Brasil. O que nós queremos agora é tratar do ponto de vista técnico esse processo de escolha de quem fornece tecnologia 5G Brasil. E isso estará a cargo do Ministério das Comunicações”, respondeu o secretário de comunicação do Itamaraty.
Sobre os insultos disparados por Araújo contra a China, ele se recusou a comentá-la diretamente. Afirmou apenas que a relação dos países é repleta de interesses comerciais e que deve haver esforço conjunto para mantê-la em bom nível, já que “quase 35% do que o Brasil exporta vai para a China”.
Índia: quebra de patentes e exportação de vacinas
Junto com a China, a Índia é responsável por mais de 70% dos suprimentos médicos importados pelo Brasil. E coube ao indiano Instituto Serum a produção das doses do imunizante da AstraZeneca que o Brasil pretendia importar enquanto não recebia os insumos para fabricar as vacinas em território nacional.
Era, portanto, previsível que o Brasil precisaria do país asiático em um futuro próximo e que, por isso, valeria a pena atuar com cautela diante dos indianos.
Ao contrário disso, no entanto, em outubro, quando a Índia e a África do Sul submeteram aos membros da Organização Mundial do Comércio (OMC) uma proposta para que fosse permitido aos países suspender patentes e outros instrumentos de propriedade intelectual na produção de terapias para o combate à pandemia de covid-19, o Brasil não apoiou as duas nações que também compõem o BRICS. Contrariando uma posição histórica em prol da quebra das patentes, o Brasil se alinhou às nações ricas, como os EUA, o Japão e a Suíça.
Para tentar remediar a situação, Bolsonaro chegou a enviar uma carta ao primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, na qual pedia urgência na entrega dos imunizantes ao Brasil.
Havia obstáculos conhecidos, já que a Índia havia afirmado que primeiro distribuiria doses de vacinas para países vizinhos (um gesto para fortalecer sua liderança regional) e que só faria isso depois que começasse seu próprio programa de vacinação, em mais uma das “lições de nacionalismo” que o próprio Araújo exaltou em visita ao país há um ano.
Mas o Planalto, orientado por Araújo, enviou mesmo assim um avião para buscar as vacinas antes do esperado pelas autoridades indianas, movimento que surpreendeu até a própria embaixada brasileira em Nova Délhi. O Itamaraty nega que tenha havido problemas de comunicação entre Araújo e a embaixada brasileira.
O resultado foi que o Airbus A330 do Brasil levou sete dias além do esperado para retornar ao Brasil com duas milhões de doses da vacina da AstraZeneca, apenas depois de a imprensa indiana ter acusado o Brasil de “queimar a largada”. Na chegada das doses ao Brasil, Araújo foi pessoalmente ao aeroporto, ao lado do embaixador indiano, para receber as doses e postar uma foto nas redes sociais. Em agradecimento, Bolsonaro esteve nesta terça na festa do Dia da Índia, em Brasília, promovida pela embaixada para celebrar a Constituição que formou a república indiana.
O secretário de comunicação Franco nega que exista qualquer mal-estar na relação entre Brasil e Índia e afirma que as duas milhões de vacinas só foram liberadas pelo esforço pessoal de Araújo e dos funcionários da Embaixada na Índia. “Não se tratou de uma questão política mas sim uma questão de produção industrial e uma questão burocrática.”.
EUA: Carta a Biden e conversa com assessor democrata crítico
Depois de ecoar as acusações sem provas de Donald Trump acerca de uma suposta fraude nas eleições presidenciais americanas de 2020, de afirmar que torcia pela reeleição do republicano e de se tornar o último líder do G-20 a reconhecer a vitória do democrata Joe Biden à Casa Branca, Bolsonaro abortou planos de comparecer à posse do presidente americano.
Ciente de que os democratas terão a questão ambiental como prioridade, e que veem o Brasil como um foco de problemas na área, com o maior desmatamento em 12 anos na Amazônia, o Itamaraty optou por enviar uma carta de princípios e intenções ao novo governo.
A carta de três páginas, escrita quase que integralmente na embaixada brasileira em Washington, marcava uma alteração clara no tom brasileiro em relação aos democratas. O Brasil se disse disposto a cooperar na questão ambiental e na defesa de valores como democracia e segurança na região. E elencou prioridades da gestão de Bolsonaro: o fechamento de um acordo bilateral de livre comércio e o ingresso na OCDE (entidade conhecida como “clube dos países ricos”).
O embaixador brasileiro em Washington, Nestor Forster, vem agindo para aumentar a interlocução em temas pouco populares com a gestão Bolsonaro. Ainda em novembro, após a derrota de Trump mas antes da transição de governos, os dois países lançaram uma plataforma de troca bilateral focada exclusivamente em questões climáticas, ambientais e populações nativas, batizado de Diálogo Ambiental. A carta de Bolsonaro a Biden acena com a recém-lançada ferramenta como prova da disposição do Brasil de cooperar.
Forster também recentemente teve um encontro com Juan Gonzalez, apontado por Biden como diretor para o hemisfério ocidental do Conselho Nacional de Segurança. Em outubro, Gonzalez afirmou ao site americano Huff Post que “qualquer pessoa, no Brasil ou em qualquer outro lugar, que pensa que pode promover um relacionamento ambicioso com os EUA enquanto ignora questões importantes como mudança climática, democracia e direitos humanos, claramente não tem ouvido Joe Biden durante a campanha”.
Questionado sobre se o Itamaraty havia se colocado em posição difícil ao associar o Brasil a um candidato presidencial derrotado nos EUA, o secretário de comunicação Franco afirmou não ver dificuldades, já que a agenda comum entre os dois países é “muito grande” e o diálogo é “intenso”. Mas reconheceu a necessidade de deixar para trás parte do que foi dito e feito nos últimos dois anos. “Nós temos que pensar prospectivamente, o que nós podemos fazer daqui para frente. Deixar de lado o que eventualmente tenha acontecido em determinadas situações, uma ou outra declaração. Isso é passado. Temos que olhar para frente, para o futuro.”
Abrindo pontes… em Sergipe
Se a diplomacia brasileira tem buscado novos caminhos para se desvencilhar dos problemas com aliados nos últimos dois anos, é incerto que Araújo possa comandar essa mudança.
“Ernesto tentará fazer o que os diplomatas fazem, mudar de discurso e tocar em frente. Mas é diferente o peso de ser um diplomata e defender certas coisas e o de ser chanceler, o formulador das políticas”, afirmou um embaixador que trabalhou com Araújo ao longo da carreira, lembrando que, no passado, o chanceler foi um defensor da política externa Sul-Sul dos governos do PT.
Ao comentar que esperava a saída do chanceler após a eleição para a presidência da Câmara e do Senado, na semana que vem, Mourão apenas ecoou o que se diz nos corredores do Congresso. No Senado, se o candidato governista Rodrigo Pacheco (DEM), franco favorito, se eleger, é provável que a presidência da Comissão de Relações Exteriores passe a ser liderada pela senadora Kátia Abreu.
Abreu, ligada ao movimento ruralista, capitaneou uma expressiva derrota para o Itamaraty em dezembro passado. O Senado rejeitou a indicação do diplomata Fábio Marzano para a delegação brasileira na Organização das Nações Unidas (ONU) em Genebra, depois que Marzano se recusou a responder aos questionamentos de Abreu sobre a possibilidade de impacto das questões ambientais na implementação do acordo comercial firmado entre Mercosul e União Europeia, que patina.
Para membros do Itamaraty, a única possibilidade de demissão seria a pressão conjunta do agronegócio e do Centrão (grupo de políticos que dá sustentação ao governo Bolsonaro no Congresso). Na interpretação tanto daqueles que o apoiam quanto dos que o detratam, o comentário de Mourão, que está com relações rompidas com Bolsonaro, pode aumentar a sobrevida do chanceler, que conta com a simpatia de Eduardo Bolsonaro, além do próprio presidente.
“Ele não vai renunciar. Vai redobrar a aposta na subserviência, e Bolsonaro, por teimosia de mula e necessidade de confrontar todo mundo, vai mantê-lo até quando possível. (O ministro da Educação Abraham) Weintraub só caiu porque ultrapassou certos limites, o que não é o caso do Ernesto, um capacho completo e satisfeito”, afirmou o embaixador Paulo Roberto Almeida.
Araújo passou os últimos dias em eventos ao lado do mandatário, protocolo que o presidente costuma adotar quando algum de seus auxiliares começa a ser alvo de especulações sobre demissão, como já aconteceu com o próprio Weintraub. Participou de live, foi citado no Twitter, esteve no almoço com insultos na churrascaria.
Nesta quinta (28/01), foi com Bolsonaro a Propriá (SE) para a inauguração de uma ponte que conecta o Estado a Alagoas. As postagens, na interpretação de seus colegas de casa, são uma forma de demonstrar que possui apoio político e de justificar suas escolhas à frente da pasta.
Uma semana antes, ao citar o patrono da diplomacia brasileira, o Barão do Rio Branco, Araújo afirmou: “O legado do Barão está bem guardado: soberania, segurança, grandeza da nação. Só estamos ameaçando o legado da política terceiromundista, muito “pragmática” em financiar tiranos e facilitar criminosos, obsequiosa ao multilateralismo antinacional, desdenhosa do povo brasileiro”.
Sputnik V é a vacina contra a covid-19 desenvolvida pela Rússia Foto: Juan Carlos Torrejon/ EFE
No Brasil, ela será produzida pela farmacêutica União Química, que planeja trazer ao País 10 milhões de doses prontas até março. Além disso, programa produzir outras 150 milhões em 2021 – e espera fabricar o insumo farmacêutico ativo no País.
Bolsonaro reuniu-se na quarta-feira com o presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, e um dos temas tratados, segundo apurou o Estadão, foi a aprovação da Sputnik V. Como mostrou a Coluna do Estadão, o Ministério da Saúde disse à União Química que está “disposto a formalizar as tratativas comerciais para eventual aquisição dos lotes do imunizante”, caso a empresa receba aval para o estudo de fase 3 e peça o uso emergencial à Anvisa.
A discussão ocorreu no momento em que o governo de São Paulo e o Ministério da Saúde travavam novo duelo pela Coronavac. A gestão Doria afirmava que, sem manifestação rápida da pasta, poderia até exportar as 56 milhões de doses da vacina que o Butantan deve produzir a partir de maio. O governo – que já comprou 46 milhões de unidades – entendia que podia responder sobre a compra dos lotes restantes até 30 de maio – mas, com a pressão, o contrato será assinado na terça.
O secretário executivo do Ministério da Saúde, Elcio Franco, chegou a dizer anteontem, à Rádio CBN, que não descartava abrir mão da segunda compra da Coronavac, caso tivesse outras opções.
Outras vacinas
Além da Sputnik V, o ministério também trata como promissora a Covaxin, desenvolvida pelo laboratório indiano Bharat Biotech. Mas, até agora, só foram publicados dados da primeira fase de pesquisa do imunizante. O governo ainda negocia a importação de mais 10 milhões de doses prontas da vacina de Oxford/AstraZeneca da Índia e conta com a produção de imunizantes pela Fiocruz e pelo Butantan.
O Instituto Gamaleya, de Moscou, que desenvolveu a Sputnik V, divulgou que sua taxa de eficácia é de 91,4%, mas ainda não publicou em artigo científico os detalhes do ensaio clínico. Ainda não está claro, por exemplo, quanto tempo a proteção da vacina pode durar.
A distribuição da Sputnik V, porém, ainda esbarra no aval da Anvisa, que aponta falta de dados básicos para poder liberar o uso emergencial do imunizante. Faltam também pesquisas de fase 3 do produto no Brasil.
Em conversas entre Planalto e Ministério da Saúde não é descartado um drible na agência sanitária, mas há resistência. Dispensar a análise da Anvisa bateria de frente com o discurso do presidente de que apenas vacinas seguras e eficazes, certificadas pelo órgão, serão distribuídas. Foi o argumento usado para atrasar a compra da Coronavac e da vacina da Pfizer.
Ainda assim, uma ideia por enquanto remota é permitir que vacinas aprovadas na agência sanitária da Rússia pudessem receber autorização excepcional para importação e distribuição no Brasil. Esse aval chegou a ser colocado em minuta da Medida Provisória 1.026/2021, que liberou a compra de imunizantes sem registro da Anvisa, mas foi excluído do texto final. Pela MP atual, só produtos registrados em EUA, União Europeia, Reino Unido, Japão e China entram na regra. Outro caminho seria imitar a decisão da Argentina, que deu o aval para o uso emergencial, com uma recomendação pouco aprofundada de sua agência reguladora.
A Anvisa detalhou ao STF a falta de dados da Sputnik, em ofício de 22 de janeiro, onde ressaltou que sequer informações exigidas para realizar a pesquisa no País foram apresentadas. Faltam ainda dados de eficácia e segurança do produto, entre eles, os de “toxicidade reprodutiva”, que mostram que a vacina não leva à infertilidade ou prejudica o desenvolvimento de um embrião, feto ou recém-nascido. O pedido foi devolvido pela agência à empresa.
A União Química não informou ao Estadão quando enviará os dados cobrados, mas interlocutores da empresa afirmam que as exigências serão cumpridas e esperam receber o aval para os estudos em breve.
Beatriz Rey: Eleição no Congresso pode dar a Bolsonaro controle inédito sobre a agenda legislativa
Estar alinhado ao comando do Congresso dá ao presidente mais influência sobre políticas públicas e um escudo protetor contra chances de ser removido do cargo
Beatriz Rey*, O Estado de S.Paulo
A eleição para a presidência da Câmara dos Deputados e do Senado no próximo dia 1º de fevereiro interessa ao presidente Jair Bolsonaro por dois motivos – e ambos determinarão o grau de independência do Legislativo em relação ao Executivo.
Primeiro, o presidente Bolsonaro quer controle da agenda legislativa (o que não teve até agora). Os presidentes da Câmara e do Senado têm amplos poderes de agenda, ou seja, eles controlam não só o que será votado no plenário mas também o timing da votação.
A cientista política e pesquisadora Beatriz Rey Foto: Arquivo Pessoal
Na Câmara, o presidente consulta o Colégio de Líderes (formado por líderes partidários e líderes da maioria, minoria, e do governo) para definir tanto a agenda mensal quanto a ordem do dia. No Senado, a decisão cabe ao seu presidente. Com os presidentes das duas casas alinhados ao governo, Bolsonaro terá a chance de trabalhar pela aprovação da sua agenda de costumes no Congresso. É importante lembrar que Bolsonaro tem mais margem de manobra para fazer isso na Câmara do que no Senado, já que os deputados têm mais interesse em receber benesses do Executivo do que os senadores. Ou seja, na Câmara, Bolsonaro consegue trocar apoio a suas pautas por cargos e verbas.
Segundo, em um sistema democrático de pesos e contrapesos, cabe à liderança do Congresso responsabilizar o presidente da República. Aqui a figura do presidente da Câmara é fundamental – é ele o responsável por aceitar o pedido que dá início ao processo de impeachment. Estar alinhado a essa liderança dá a Bolsonaro um escudo protetor contra controvérsias que afetem as chances de ser removido do cargo (além das que envolvem a sua família). Portanto, o comando do Congresso – e principalmente da Câmara – interessa a Bolsonaro porque o presidente quer ter maior controle sobre políticas públicas e o seu próprio futuro político.
*Beatriz Rey é cientista política e pesquisadora associada ao Centro de Estudos da América Latina da American University, em Washington DC, onde estuda política legislativa na região
Murillo de Aragão: Adversários à frente da Câmara e do Senado seriam pesadelo para Bolsonaro
Atribuições de presidentes incluem definição de pautas legislativas, influência sobre instalação de CPIs e abertura de processos de impeachment
Murillo de Aragão*, O Estado de S.Paulo
Em meio à pandemia de covid-19, e não contando com uma base política estável, o presidente Jair Bolsonaro joga (ou jogou) todas as suas fichas para ter candidatos amigáveis às presidências da Câmara dos Deputados e do Senado Federal neste início de reta final do seu mandato. Trata-se de postos que, dependendo dos eleitos, podem lhe assegurar governabilidade em um cenário de crescente autonomia do Poder Legislativo.
O professor adjunto da Columbia University e CEO da Arko Advice, Murillo de Aragão Foto: José Benigno/Estadão
A presidência da Câmara, em especial, é uma posição estratégica para o presidente da República. Basicamente porque cabe ao presidente da Casa aceitar ou não um pedido de impeachment contra o supremo mandatário da nação. E essa é a característica essencial do comando do Legislativo em relação ao presidente da República.
Mas existem outras questões em jogo, como o fato de o presidente da Câmara comandar a agenda de votações junto com os líderes partidários. Tanto pela fragmentação partidária quanto pelo alto nível de infidelidade dos deputados às orientações partidárias, o poder do presidente da Câmara na formulação da agenda é relevante.
Nesse contexto, o presidente da Casa, junto com os líderes, determina os relatores de matérias fundamentais. Além de comandar as votações no plenário, o deputado que ocupa a cadeira da presidência tem ainda grande influência sobre a instalação de Comissões Parlamentares de Inquérito, as CPIs.
O cargo de presidente do Senadotambém é vital para o Executivo não apenas pelas razões já mencionadas, mas também porque são os senadores que promovem as sabatinas para aprovação, ou não, dos indicados aos cargos de presidente do Banco Central, de ministros do Supremo Tribunal Federal e de diretores de agências reguladoras, todos indicados pelo presidente da República. Os senadores destacam-se também tanto no comando da agenda quanto das sessões do Congresso Nacional que avaliam e votam os vetos presidenciais.
Ter como aliados os presidentes da Câmara e do Senado é um conforto político de imenso valor para o presidente da República. Por outro lado, tê-los como adversários pode significar um pesadelo.
*Murillo de Aragão é mestre em ciência política e doutor em sociologia pela UnB, professor adjunto da Columbia University e CEO da Arko Advice